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Integração de cuidados no SNS melhorou, mas há “um longo caminho” a fazer – estudo

LUSA
07-11-2025 07:00h

A integração dos cuidados prestados aos utentes entre os centros de saúde e os hospitais melhorou no último ano, mas há “ainda um caminho longo a fazer” para concretizar essa reforma da organização do SNS iniciada em 2024.

Esta é a principal conclusão do segundo barómetro promovido pela Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH) sobre a forma como os profissionais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) avaliam a integração de cuidados nas Unidades Locais de Saúde (ULS) e que será apresentado numa conferência que decorre hoje e sábado em Vila Nova de Gaia.

No início de 2024, no âmbito de um novo modelo de organização do SNS, foram criadas 31 ULS, que se juntaram às oito já existentes, passando os cuidados primários (centros de saúde) e os cuidados hospitalares a estarem integrados numa única entidade por área geográfica, com o objetivo de facilitar o percurso dos utentes no sistema.

Depois de quase dois anos desta alteração no funcionamento do SNS, a integração entre os dois níveis de cuidados de saúde – primários e hospitalares – “melhorou, mas há um caminho longo a percorrer”, adiantou à Lusa o presidente da APAH.

Os 7.385 profissionais das unidades do SNS que responderam ao inquérito “consideram que existe hoje uma maior integração de cuidados do que existia há um ano”, salientou Xavier Barreto.

O barómetro concluiu que, numa escala de zero a cinco, os profissionais de saúde do SNS avaliaram com 3,29 a integração de cuidados de saúde nas ULS, uma nota “moderadamente positiva” e superior aos 3,02 registados na primeira edição do inquérito.

Segundo o presidente da associação, apesar desta evolução, as conclusões do estudo indicam que ainda há áreas que continuam por concretizar ao nível clínico, como são exemplos a definição de percursos comuns para os doentes e de critérios de referenciação partilhados.

“Esta definição de um percurso consensualizado é uma ideia muito importante e que continua a não existir na maior parte das ULS”, alertou Xavier Barreto, para quem o barómetro demonstrou que, na vertente clínica, há ainda trabalho a desenvolver para concretizar a plena integração dos cuidados prestados aos utentes.

A dimensão financeira – uma das seis avaliadas no barómetro - foi a classificada com pior pontuação pelos profissionais do SNS, o que se justifica, segundo o presidente da APAH, pela falta de alinhamento na política de incentivos entre os centros de saúde e os hospitais.

“A ideia é ótima, mas tem um problema. É que os objetivos dos cuidados de saúde primários não são iguais aos dos hospitais. Não são os mesmos, são diferentes. Não existe um alinhamento claro de objetivos”, referiu o administrador hospitalar.

Os profissionais dos cuidados de saúde primários “recebem pelo seu desempenho e os dos cuidados hospitalares, na maior parte dos casos, não, com exceção de algumas experiências muito limitadas”, referiu Xavier Barreto, para quem o alinhamento de incentivos para os profissionais dos dois níveis de cuidados é um “passo determinante para as pessoas perceberem que estão todas a remar para o mesmo lado”.

Segundo referiu, a solução pode passar por equipas partilhadas, que se devem “sentar à mesma mesa” para avaliar, por exemplo, a estratégia para tratar várias doenças, como a diabetes e a hipertensão, numa determinada ULS, definindo indicadores de desempenho e incentivos para toda a equipa, independentemente do nível de cuidados a que pertençam.

O barómetro concluiu ainda que a perceção da integração de cuidados é maior no norte do que nas regiões mais a sul, o que poderá estar relacionado com a maior falta de profissionais de saúde e com a baixa cobertura de médicos de família no sul do país.

Além disso, as ULS que foram criadas antes da reforma de 2024 – Matosinhos, Guarda, Baixo Alentejo, Alto Minho, Castelo Branco, Nordeste, Litoral Alentejano e Alto Alentejo – apresentam um nível de integração de cuidados superior, o que Xavier Barreto considerou ser expectável, devido à articulação feita ao longo do tempo entre as equipas dos cuidados de saúde primários e hospitalares.

O administrador hospitalar referiu ainda que a generalização das ULS em todo o país – atualmente são 39 – constituiu uma “ideia boa e que merece ser prosseguida”, mas que foi implementada com “alguns problemas à partida”, como os sistemas de informação entre os centros de saúde e os hospitais e a falta de uniformização dos incentivos.

“Havia vários obstáculos à partida que deviam ter sido mais bem pensados e ultrapassados de uma outra forma no momento da criação das ULS”, afirmou Xavier Barreto, manifestando-se convicto que essas unidades de saúde vão promover, porém, uma cada vez maior integração de cuidados de saúde.

É um processo que “vai demorar tempo”, admitiu o administrador, alegando que isso obriga cada um dos profissionais a perceber que “trabalha numa equipa, com muitos profissionais de vários níveis de cuidados e que tem de discutir aquilo que quer fazer, o seu trabalho, a sua abordagem ao doente com o conjunto de outras pessoas”.

A segunda edição do Barómetro de Integração de Cuidados é uma iniciativa APAH, com apoio da EY, dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS) e da Bayer e incluiu um questionário anónimo para avaliar as dimensões clínica, de informação, normativa, administrativa, financeira e sistémica, através de 53 itens.

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