O PAN defende a criação de salas para consumo assistido de drogas nos Açores, para dar mais segurança e dignidade aos toxicodependentes, mas a medida gera divisão, mesmo entre instituições que trabalham na área da reabilitação e integração social.
“Há 20 anos, se calhar não se justificava uma casa de consumo assistido. Hoje em dia, acredito piamente que sim, justifica-se. Até porque o que a gente vê (…), os consumos a céu aberto, é apenas a ponta do iceberg, porque existe muito mais além disso”, disse Rui Santos, da Associação Novo Dia, na Comissão de Assuntos Sociais da Assembleia Legislativa dos Açores, reunida em Ponta Delgada.
Também Helder Fernandes, representante da mesma associação, que se dedica à inclusão social e à promoção da “igualdade para todos”, entende que a criação de salas de consumo assistido de drogas, sobretudo nos concelhos de Ponta Delgada e da Ribeira Grande, em São Miguel, traria várias “vantagens”.
“É uma questão de saúde pública e estamos a garantir também a proteção individual e a proteção coletiva das pessoas, e é uma forma de aproximação dos serviços que vai permitir que as pessoas tenham um local onde possam fazer o consumo de forma segura e monitorizada, através de uma equipa especializada”, realçou.
Suzete Frias, da Associação Arrisca, também ouvida hoje pelos deputados a propósito da iniciativa do PAN (partido das Pessoas, Animais e Natureza), tem uma opinião contrária e defende que devem ser aplicadas outras medidas antes de se avançar para a criação de salas de consumo assistido de drogas nos Açores.
“No meu entender, antes de uma sala de consumo assistido, deveríamos ter mais um centro de abrigo em Ponta Delgada, e outro na Ribeira Grande, centros de acolhimento temporário, e um consultório móvel”, onde sejam prestados tratamentos, não só na área das dependências, mas também na área da saúde física.
Na sua opinião, a prioridade, nesta área, devia passar pela criação de mais “respostas sociais”, que ajudem a tirar os toxicodependentes das ruas, em vez de se avançar com uma medida que poderá provocar “ruído social” junto da população açoriana.
“Isto iria provocar ruído social. Um tumulto social. E seria dinheiro gasto sem a devida utilidade”, insistiu Suzete Frias, que ressalva que não é contra a criação de salas para o consumo assistido de drogas nos Açores, apenas discorda do “timing” da medida.
Já o coordenador da Polícia Judiciária (PJ) nos Açores, Renato Furtado, também ouvido nesta comissão parlamentar, disse estar mais preocupado com o tráfico do que com o consumo de drogas, mas admitiu ter dúvidas em relação às vantagens da criação de salas de consumo assistido no arquipélago.
“Vejo uma solução destas com reservas, mas avançando, considero que não deve ser um projeto holístico, ou seja, isto deve ir crescendo, e deverá começar por uma projeto-piloto nas zonas mais sensíveis para esta temática, que será, certamente, na ilha de São Miguel, e seguramente entre Ponta Delgada e Ribeira Grande”, justificou.
Renato Furtado lembrou, também, que a localização das casas de consumo assistido de drogas será “fundamental” para o sucesso da iniciativa, adiantando que, se ficarem longe dos locais de aquisição dos estupefacientes, vão acabar por ficar "desertas”, na medida em que os toxicodependentes querem, em regra, consumir as drogas “o mais rápido possível”.
O deputado único do PAN no parlamento açoriano, Pedro Neves, entende que as salas para o consumo assistido de drogas, sobretudo em São Miguel, seriam uma forma de combater as “repercussões visíveis do crescente consumo de novas substâncias psicoativas”, conhecidas como drogas sintéticas.
“A iniciativa pretende proporcionar um ambiente seguro aos consumidores, reduzir o risco de doenças infetocontagiosas, intervenção imediata em casos de emergência, redução dos comportamentos de risco e diminuição dos consumos em público”, pode ler-se na proposta entregue na Assembleia Regional.