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Covid-19: Moçambique deve gerir equilíbrio entre segurança sanitária e segurança alimentar - académico

LUSA
22-04-2020 10:32h

O académico moçambicano Lourenço do Rosário disse hoje à Lusa que o Governo moçambicano deve gerir o "difícil equilíbrio" entre a contenção do alastramento da covid-19 e a sobrevivência das populações pobres, fora de um confinamento geral.

"O Estado tem de encontrar uma vizinhança saudável no limite entre a segurança sanitária e a segurança alimentar para as populações mais desfavorecidas", defendeu Lourenço do Rosário, fundador e antigo reitor de A Politécnica, a primeira universidade privada em Moçambique.

Esse equilíbrio, prosseguiu, passa por as autoridades moçambicanas impedirem uma catástrofe que seria provocada por um rápido alastramento da pandemia da covid-19 ao mesmo tempo que permitem que as famílias sem recursos continuem a assegurar o seu rendimento na economia informal.

"Como o nosso Estado não é capaz de providenciar uma cesta básica para estas pessoas que são retiradas da sua fonte de sobrevivência do dia-a-dia, tem de se encontrar uma fórmula que permita de facto conjugar os limites de cada um desses problemas", acrescentou.

A imposição de um confinamento domiciliário geral em Moçambique, no contexto de uma eventual prorrogação do estado de emergência, que termina no dia 30 de abril, é impossível, porque iria provocar uma perturbação da paz social, avisou Lourenço do Rosário.

"A gente está expectante, para ver o que vai acontecer, o que é que o Governo vai inventar para manter a economia minimamente funcional e, por outro lado, manter o controlo da contaminação", observou.

Rosário recordou que mais de 50% da população moçambicana é pobre, é constituída por agregados familiares com uma média de cinco pessoas e depende normalmente de um provedor que tem um trabalho independente e precário na economia informal.

Lourenço do Rosário considerou louvável a atuação do Governo no campo da saúde, assinalando que a concentração da testagem nos focos de maior suspeita é a melhor abordagem, dadas as gritantes carências do país.

"O nosso Ministério da Saúde e as autoridades sanitárias estão a agir de uma forma muito prudente e louvável, que é tentar manter o controlo da informação sobre a contaminação em conformidade com a capacidade sanitária instalada", referiu.

Uma testagem mais direcionada permite às autoridades de saúde um compasso que lhes dá tempo para retardar o pico até uma altura em que o Sistema Nacional de Saúde esteja minimamente preparado para um cenário mais complicado ou em que se vislumbre uma vacina.

Lourenço do Rosário avisou que a testagem e rastreio dirigidos apenas a focos suspeitos em detrimento de uma testagem em massa pode estar a deixar de fora muitas pessoas infetadas.

"Não significa que os números que estão a ser apresentados sejam totalmente reais, mas é o que é realmente conhecido, as próprias entidades sanitárias reconhecem que têm capacidade limitada para poder seguir todos os contornos de contaminação que possam existir no nosso país", notou o académico.

Enquanto o país não conhece uma explosão de casos de infeção por covid-19, os moçambicanos vão mostrando uma "admirável serenidade", edificada por uma história de sofrimento provocada por conflitos armados e desastres naturais.

"As pessoas criaram uma, digamos assim, uma cultura de convivência com a ansiedade, com catástrofes e com medos", ressalvou.

Moçambique tem oficialmente 39 casos positivos de covid-19.

A nível global, segundo um balanço da AFP, a pandemia de covid-19 já provocou mais de 170 mil mortos e infetou quase 2,5 milhões de pessoas em 193 países e territórios.

Lourenço do Rosário é atualmente presidente do Fórum Nacional do Mecanismo Africano de Revisão de Pares (MARP), uma plataforma da sociedade civil criada por iniciativa da União Africana (UA), para uma avaliação independente do nível de desenvolvimento económico, social e democrático de cada país membro da organização.

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