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Covid-19: Impacto incerto nos conflitos no Médio Oriente

LUSA
09-04-2020 14:34h

O coronavírus causou dezenas de milhares de mortos e forçou metade da humanidade ao confinamento, mas o impacto da pandemia nas guerras no Médio Oriente é incerto, apesar dos apelos da ONU a um cessar-fogo em todo o mundo.

As Nações Unidas têm vindo a pedir que se suspendam todas as hostilidades, incluindo no Médio Oriente, para ajudar a conter a propagação do vírus e evitar novas tragédias humanitárias às populações vítimas dos conflitos.

No Médio Oriente, uma primeira consequência concreta foi o anúncio saudita na quarta-feira de um cessar-fogo unilateral no Iémen.

Eis a situação em quatro países resumida pela agência France-Presse:

 

- Iémen –

Um cessar-fogo unilateral da coligação internacional conduzida pela Arábia Saudita, que intervém no Iémen em apoio às forças governamentais, entrou hoje em vigor às 09:00 TMG (10:00 em Lisboa), com a duração prevista de duas semanas.

Riade disse esperar que a trégua, justificada com a necessidade de se combater a covid-19, possa conduzir ao fim do conflito, que dura há cinco anos.

Os rebeldes Huthis, apoiados pelo Irão e contra os quais luta a coligação, ainda não reagiram ao cessar-fogo.

Se a trégua se mantiver, será o primeiro avanço desde que os beligerantes aceitaram no final de 2018 um cessar-fogo patrocinado pela ONU para a cidade portuária de Hodeida (sudoeste).

Algumas horas antes do anúncio do cessar-fogo, os Huthis tinham divulgado um documento com a sua visão do modo de acabar com o conflito, no qual pediam a retirada das tropas estrangeiras e o fim do bloqueio da coligação aos portos e espaço aéreo do Iémen, assim como que a coligação pague os salários dos funcionários públicos para a próxima década e que financie a reconstrução do país.

A violência aumentou nos últimos tempos no Iémen e as organizações não-governamentais temem uma catástrofe no caso de propagação do novo coronavírus, embora o país ainda não tenha anunciado qualquer caso de infeção.

O péssimo sistema de saúde e o facto de mais de dois terços da população precisar de ajuda humanitária explicam a preocupação.

 

- Síria -

O novo coronavírus começou a ganhar escala internacional no início de março, na altura em que entrou em vigor uma nova trégua na província de Idlib e arredores, no noroeste da Síria, entre o regime e o seu aliado russo de um lado e os grupos ‘jihadistas’ e rebeldes (alguns dos quais apoiados pelos turcos) do outro.

Os três milhões de habitantes daquela região tinham pouca esperança de que a acalmia durasse, exaustos com a última ofensiva sangrenta de Damasco, mas o receio face à epidemia parece estar a contribuir para preservar a trégua.

Em março, o balanço das mortes de civis (103) foi o mais baixo desde o início do conflito em 2011, segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH).

Para os diferentes atores no terreno – o regime, as forças curas no nordeste e as fações anti-Damasco em Idlib – uma boa gestão da epidemia permitirá consolidar a sua credibilidade.

“Esta epidemia é uma maneira de Damasco mostrar que apenas o Estado sírio é eficaz e que, portanto, é necessário reintegrar os diferentes territórios sob o seu governo”, considera o especialista Fabrice Balanche.

Por outro lado, a pandemia pode precipitar a saída das tropas norte-americanas, sendo uma “questão importante” a sua “segurança em termos de saúde”, adiantou. E isso contribuiria para um vazio que encorajaria uma ressurgência do grupo extremista Estado Islâmico.

Em nove anos, o conflito sírio causou mais de 380.000 mortos e milhões de deslocados, particularmente vulnerável em caso de propagação da epidemia.

 

- Líbia -

Os protagonistas do conflito líbio saudaram no mês passado o apelo das Nações Unidos para um cessar-fogo, antes de retomarem as hostilidades.

Os combates intensificaram-se recentemente, afetando vários bairros residenciais da capital, Tripoli.

Desde o início do ano, a violência deslocou 200.000 pessoas, a grande maioria em Tripoli, segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM).

Na segunda-feira foi atingido um hospital em Tripoli onde são tratados doentes com covid-19, lamentou a organização.

“Continua a existir uma grande distância entre as declarações e os atos”, criticou recentemente o secretário-geral da ONU, António Guterres, referindo-se à Líbia.

No conflito, a Turquia apoia o governo na capital, reconhecido pela ONU e que enfrenta há um ano uma ofensiva do homem forte do leste líbio, o marechal Khalifa Haftar.

Para Fabrice Balanche, o abandono ocidental dos conflitos na região pode favorecer neste caso as forças pró-Haftar, apoiadas pela Rússia, o Egito e os Emirados Árabes Unidos.

Os países ocidentais estão a ser duramente atingidos pela pandemia, o que poderá pressioná-los para desviarem os recursos militares dos conflitos estrangeiros, mas também enfraquecer os processos de negociação.

Segundo um relatório do centro de reflexão International Crisis Group (ICG), os esforços para garantir o cessar-fogo na Líbia “já não mobilizam a atenção ao mais alto nível”.

 

- Iraque –

No Iraque a guerra já acabou, mas o país continua sob a ameaça do ressurgimento do grupo extremista Estado Islâmico e mantém-se a tensão entre os Estados Unidos e o Irão.

Washington deslocou recentemente para o país baterias de defesa antiaérea fazendo recear uma nova escalada com o Irão.

Os Estados Unidos responsabilizam as milícias iraquianas pró-Teerão pelos mísseis disparados sobre a Zona Verde de Bagdad, onde se localiza a sua embaixada, e bases onde se encontram soldados norte-americanos.

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