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Covid-19: Moçambicana Tsitsi arrisca exposição por causa de um enxoval do Zimbabué

LUSA
20-03-2020 12:07h

No fim da gravidez, a moçambicana Tsitsi Bendjane diz que não teve escolha para comprar enxoval, senão enfrentar o pânico pela Covid-19 e arriscar uma quarentena ao atravessar a fronteira para o Zimbabué.

As filas são imensas, compactas, com dezenas de pessoas, sem a distância recomendada pelas autoridades de saúde em todo o mundo para prevenir a transmissão do novo coronavírus.

O Zimbabué entrou em estado de 'desastre nacional' na terça-feira, apesar de ainda não registar nenhum caso de infeção.

“Eu tenho medo, mas preciso comprar o enxoval do bebé, não tenho opção”, diz Tsitsi Bendjane à Lusa, na língua shona, logo depois de carimbar o passaporte na fronteira de Machipanda, quando faltam apenas duas semanas para o filho nascer.

“Só hoje tive dinheiro para as compras” justifica, insistindo no facto de o filho poder vir a nascer na véspera do inverno e de “só em Harare conseguir encontrar um enxoval acessível”.

A empregada doméstica vive em Machipanda, uma localidade da província de Manica, Centro de Moçambique, que dá nome ao principal posto de fronteira com o Zimbabué.

A afinidade cultural e económica com aquele país supera receios.

A situação social e económica de vários moçambicanos e zimbabueanos leva-os a enfrentar riscos de infeção nas longas filas da travessia, onde se encontram, sobretudo, zimbabueanos em busca de bens essenciais em Moçambique, face à débil situação económica do Zimbabué.

A zimbabueana Julia Maphaike passou pelo teste de temperatura e desinfeção das mãos com cloro e agora pode carimbar o passaporte e entrar para Moçambique, onde pretende comprar alimentos e cadernos escolares para os filhos.

Dispensa o pânico em torno do novo coronavírus e diz ter “fé em Deus” para a sua proteção.

As autoridades de saúde e de migração em Manica dizem ter reforçado em conjunto as medidas de controlo, mas o aglomerado de pessoas deixa dúvidas sobre a eficiência de medidas de prevenção.

Nunes Horácio, responsável pelo departamento provincial de Assistência Médica em Manica, diz que está a haver divulgação de informação e que as pessoas provenientes dos países em risco e com temperatura alta, são orientados para quarentena domiciliária ou hospitalar, consoante a severidade dos sintomas.

Por outro lado, está a ser travada a entrada de pessoas com um carimbo da África do Sul há menos de 14 dias, disse Jorge Machava, porta-voz dos serviços provinciais de Migração.

“Sabemos que a África do Sul já tem números elevados de pessoas infetadas. Se não tiverem cumprido com o período de quarentena, essas pessoas são devolvidas”, precisa.

Na quarta-feira, esta medida abrangeu 10 zimbabueanos, que viram rejeitada a sua entrada em Moçambique.

O camionista moçambicano Eduardo Bio diz que entrega tudo "nas mãos da sorte" depois de ter ouvido rumores de casos suspeitos em duas províncias do Zimbabué por onde passou: Bulawayo e Manicaland.

“Como motorista, é assustador. São várias fronteiras que passamos, estamos sempre em transito”, diz à Lusa, adiantando que a medida que lhe dá conforto é o rastreio que encontra nos postos fronteiriços.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da Covid-19, já infetou mais de 235 mil pessoas em todo o mundo, entre as quais mais de 9.800 morreram.

Das pessoas infetadas, mais de 86.600 recuperaram da doença.

Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se já por 177 países e territórios, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.

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