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Covid-19: Valter Hugo Mãe alerta brasileiros sobre propagação do vírus e critica Bolsonaro

LUSA
20-03-2020 10:25h

O escritor português Valter Hugo Mãe alertou na quinta-feira os brasileiros sobre a propagação do novo coronavírus, numa carta publicada no portal The Intercept, tecendo duras críticas à postura do Presidente do país, Jair Bolsonaro, face à pandemia.

"Sinto estar a escrever-vos do futuro, porque esta pandemia abateu-se sobre a Europa antes de ser clara no Brasil, e porque aqui tomamos as medidas que se julgam necessárias um pouco mais cedo. Vocês precisam mobilizar-se voluntariamente para esta preocupação", escreveu o autor português.

"Infelizmente, o vosso Presidente não só não é lúcido para alertar a população do Brasil, como age de modo irresponsável, não cumprindo as mais elementares regras para a segurança das outras pessoas. O exemplo do vosso Presidente é um desastre grotesco que em praticamente todos os regimes jurídicos configura crime de leviano contágio de doença potencialmente fatal", acrescentou Valter Hugo Mãe.

Numa carta endereçada aos cidadãos brasileiros, e justificada pela "demora na tomada de consciência" do país, Valter Hugo Mãe descreveu a evolução do vírus em alguns dos países mais afetados da Europa, apelando para que o Brasil "não tome por exagerados os alertas vindos de fora".

"Em Itália (...) apenas num dia morreram cerca de 500 pessoas. Num país com um dos melhores sistemas de saúde do mundo. Morreram pelo coronavírus, sim, mas morreram sobretudo porque o sistema colapsou. Vocês acreditam que o sistema de saúde brasileiro é melhor que o da Itália? Vocês vão esperar para descobrir o que acontece se agirem demasiado tarde? Já imaginaram quantas pessoas morrerão no gigante brasileiro se em Itália podem morrer 500 num só dia?", questionou.

O número de mortes pelo novo coronavírus no Brasil aumentou na quinta-feira para seis, com o país a registar 621 pessoas infetadas, revelou o Ministério da Saúde brasileiro.

A tutela informou ainda que não anunciará mais os casos suspeitos no país. Na quarta-feira, o Brasil tinha 11.278 casos suspeitos.

"A facilidade de transmissão deste vírus é tão grande que ele pode matar muito mais do que seria natural, simplesmente porque existem mais pessoas doentes do que qualquer sistema de saúde do mundo pode atender", frisou o escritor.

"Se eu estiver 'escrevendo do futuro', percebam que não falo de mais de uns dias adiante. Estamos, talvez, 15 dias à frente. São os 15 dias que têm para salvar o vosso país de uma derrocada sanitária e económica sem comparação com nada do que viram até agora. Desejo-vos toda a sorte e toda a lucidez. Desejo-vos melhores políticos e sempre a grande arte que vos representa no mundo com esplendor", concluiu Valter Hugo Mãe.

O chefe de Estado brasileiro tem sido bastante criticado pela postura relação à pandemia do novo coronavírus, tendo chegado a afirmar que se tratava de "histeria e fantasia" divulgada pela imprensa.

Jair Bolsonaro também foi fortemente criticado por ameaçar a saúde pública quando, no domingo, cumprimentou e tirou 'selfies' com centenas de apoiantes.

O Presidente brasileiro contrariou as recomendações do executivo brasileiro, que desaconselhou grandes aglomerações de pessoas devido à pandemia da Covid-19, ao juntar-se a dezenas de apoiantes numa manifestação.

Segundo o jornal Estadão, Bolsonaro teve contacto direto com pelo menos 272 pessoas, em cerca de 58 minutos de interação com apoiantes na frente do Palácio do Planalto, que o próprio chefe de Estado partilhou, através de vídeo, na rede social Facebook.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da Covid-19, infetou mais de 235 mil pessoas em todo o mundo, das quais mais de 9.800 morreram.

Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se já por 177 países e territórios, o que levou a Organização Mundial da Saúde a declarar uma situação de pandemia.

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