A Entidade Reguladora da Saúde (ERS) recomendou ao Ministério da Saúde que esclareça o enquadramento legal de acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) por imigrantes não regularizados em Portugal, assim como a responsabilidade financeira pelos cuidados prestados.
A recomendação da ERS ao Governo vai no sentido de que o Ministério da Saúde “adote as medidas necessárias, nomeadamente, jurídico-normativas, no sentido de esclarecer a interpretação e aplicação da lei em matéria do acesso a cuidados de saúde por parte de cidadãos imigrantes”.
Em causa estão “cidadãos que não dispõem de autorização de residência nem de atestado de residência superior a 90 dias emitido pela junta de freguesia”, acrescentando a ERS que é também necessário clarificar a “responsabilidade financeira pelos encargos gerados pelos cuidados prestados a esses cidadãos”.
A confusão jurídica decorre do que a ERS entende ser um conflito entre o disposto no Regulamento do Registo Nacional de Utentes (RNU) e uma circular da Direção-Geral da Saúde (DGS), de 2009, ainda em vigor, apesar de anterior à nova Lei de Bases da Saúde, de 2019, e diplomas dela decorrentes.
O Regulamento RNU determina que ficam isentos de pagamento no SNS para aceder a “cuidados urgentes e vitais” os estrangeiros que apesar de ainda não terem um documento de autorização de residência, possuam um atestado da junta de freguesia a comprovar a residência no país há mais de 90 dias.
A ERS refere que o Regulamento RNU não esclarece a abrangência do conceito “cuidados urgentes e vitais”, mas diz que a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), durante o processo de consulta para a elaboração da recomendação, manifestou o entendimento que podem ser cobradas despesas a estrangeiros desde que os cuidados não se enquadrem nos enunciados na circular da DGS e que vão além da disposição restritiva de “cuidados urgentes e vitais”.
Essa circular, para além de isentar de pagamento a prestação de “cuidados de saúde urgentes e vitais”, torna gratuita a assistência médica no SNS para estrangeiros indocumentados em casos de doenças transmissíveis e risco para a saúde pública (como tuberculose ou sida, por exemplo); cuidados de saúde materno-infantil, nomeadamente partos, interrupção voluntária da gravidez ou acompanhamento durante a gravidez; vacinação de acordo com o Programa Nacional de Vacinação.
Abrange ainda estrangeiros em situação de reagrupamento familiar quando alguém do agregado comprovadamente descontar para a Segurança Social; e casos de exclusão social ou carência económica comprovada.
Acresce às dúvidas levantadas pela ERS o facto de a nova Lei de Bases de Saúde incluir no conceito de beneficiário do SNS “migrantes com ou sem a respetiva situação legalizada”.
Perante isto, a ERS recomenda ao Governo um esclarecimento jurídico da legislação aplicável a estrangeiros irregulares no acesso ao SNS e, à ACSS, “que, em articulação com as entidades legalmente competentes, proceda à concretização do conceito de ‘cuidados urgentes e vitais’”.
À ACSS reitera ainda recomendações anteriores para que adote “medidas adequadas ao registo, tratamento e monitorização dos dados e informações reais sobre cada um dos cidadãos estrangeiros que acede aos cuidados de saúde no SNS”.
Recomenda ainda à ACSS a divulgação do Regulamento RNU e do regulamento para inscrição nos cuidados de saúde primários junto dos estabelecimentos do SNS, assim como a “emissão e divulgação das orientações necessárias ao cumprimento cabal e uniformizado” desses regulamentos; e aos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS) “que adeque os sistemas de informação em uso pelos estabelecimentos”.
Finalmente, a ERS recomenda ainda à Direção Executiva do SNS que “garanta uma atuação uniforme por parte das Unidades Locais no que respeita ao acesso por cidadãos estrangeiros aos cuidados de saúde”.