O inspetor-geral das Atividades em Saúde remeteu hoje para o parlamento a decisão sobre se houve interferência política na marcação da consulta das gémeas luso-brasileiras e assinalou que a IGAS não investigou o comportamento e as intenções dos governantes.
“A Inspeção-Geral das Atividades em Saúde não investigou o comportamento do Presidente de República ou da Casa Civil, do primeiro-ministro, da ministra da Saúde ou de secretário de Estado da Saúde, nem tampouco de nenhum deputado da Assembleia da República. Não o pode fazer”, disse António Carapeto.
Na sua audição na comissão parlamentar ao caso das gémeas luso-brasileiras tratadas com o medicamento Zolgensma no Hospital de Santa Maria, em Lisboa (2020), o responsável esclareceu na declaração inicial que “não são atribuições” da IGAS “avaliar se tais comportamentos podem consubstanciar um crime ou aferir responsabilidade política de alguém”.
“Se houve interferência política ou não, acho que deve ser a Assembleia da República a decidir. Não é possível que nenhum político interfira nas minhas decisões. Não é possível. É totalmente impossível, porque eu nunca aceitaria isso”, salientou.
António Carapeto, que foi inquirido pelos deputados mais de duas horas, recordou, como já tinham dito as inspetoras do IGAS, que o hospital de Dona Estefânia não foi objeto de investigação, porque “não abriu as portas às crianças”.
“Pedimos documentação e fomos ouvir as pessoas do Centro Hospitalar de Lisboa Central, mas o Centro Hospital de Lisboa Central não abriu as portas às crianças, e era isso que queríamos saber. […] As inspetoras estão a raciocinar em termos de processo. Só tem a porta aberta do Centro Hospital de Lisboa Norte e é o que é factual”, justificou o responsável, após ser interpelado por Joana Cordeiro, da IL.
À deputada liberal, o inspetor adiantou que a IGAS enviou a documentação “muito cedo” para o Ministério Público a pedido do próprio.
Lembrando a conclusão do relatório da IGAS que aponta para a irregularidade na marcação da consulta das crianças, António Carapeto, que assumiu cargo de inspetor-geral em 2020, observou que as “consultas são agendadas no centro de saúde e nas unidades locais de saúde da aérea de residência”.
“É assim que o Serviço Nacional de Saúde [SNS] deve funcionar, se não funciona assim, funciona mal”, disse, em resposta ao deputado Livre Paulo Muacho.
Sobre se houve irregularidades nos documentos disponibilizados pela Presidência da República, o dirigente reiterou que não avaliou comportamento dos órgãos de soberania do Estado, mas das estruturas do SNS.
“O que considerámos inadequado foi a forma como a consulta foi agendada. […] Nós estamos a avaliar se o SNS agiu de forma correta ou incorretamente”, disse ao deputado do PSD António Rodrigues, acrescentando que pediu documentação à Casa Civil da Presidência da República “ao abrigo de um dever de colaboração”.
Por seu lado, a deputada socialista Ana Abrunhosa acusou António Carapeto de não estar a corroborar o que está no relatório, quando refere que se as crianças fossem atendidas no Grupo Lusíadas seriam encaminhadas para o Hospital de Santa Maria.
“Depende sempre da avaliação que os médicos fazem. […] Não podemos dizer com certeza que se tivessem sido atendidas ali [no Lusíadas], seriam encaminhas [para o Santa Maria]. Mas isso era possível de acordo com as regras”, realçou.
Citando o relatório, a deputada do PS referiu que se “as crianças tivessem sido atendidas no Lusíadas, teriam acabado no sítio certo”.
O inspetor-geral recordou que a IGAS está "perto do fim do processo de inspeção" ao Hospital de Santa Maria, à Secretaria-Geral do Ministério da Saúde e ao Infarmed", acrescentando que, "se não cumprirem as recomendações", pode ser instaurada uma diretiva específica.