A antiga secretária de Estado do Orçamento Cláudia Joaquim justificou hoje a devolução de saldos das entidades da administração pública, como aconteceu com o INEM em 2020, com uma norma do Orçamento do Estado introduzida em 2015 pelo governo PSD/CDS.
“A norma que habilitou a transferência de saldos do INEM (…) é uma norma do Orçamento do Estado. Não é uma questão de racional, mas de legalidade”, afirmou Cláudia Joaquim, que foi secretária de Estado do Orçamento entre 15 de junho de 2020 a 30 de março de 2022, lembrando que, em 2015, o Governo era PSD/CDS.
A antiga governante falava durante a Comissão Parlamentar de Saúde, onde hoje foi ouvida, a pedido do PSD, sobre o Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), designadamente depois de o ex-presidente do instituto ter dito que o INEM foi obrigado a transferir para o Ministério da Saúde 90 milhões de euros em 2020 por causa da pandemia e que isso prejudicou a gestão financeira, designadamente a renovação de frota de ambulâncias.
Questionada pelos diversos partidos, a antiga governante lembrou que, em 2020, quando a Assembleia da República aprovou o orçamento suplementar “aprovou a integração e uso de saldos dos organismos ligados à saúde no valor de 159 milhões de euros, onde estavam saldos do INEM”.
Explicou ainda que a norma em causa define que os saldos de execução orçamental das entidades tuteladas pelo Ministério da Saúde - excluindo hospitais, unidades locais de saúde e centros hospitalares – “são integradas automaticamente no orçamento da ACSS” [Administração Central dos Sistemas de Saúde].
Cláudia Joaquim disse ainda que a Saúde é a área em que os saldos de receitas gerais “não são devolvidos ao Estado, mas integrados na ACSS”, sublinhando que isto permite uma “melhor gestão orçamental em cada ano”.
“Isto permite que haja gestão no Ministério da Saúde de todas as necessidades. (…). Isto significa que, se uma entidade transferiu [para a ACSS], por exemplo, saldos de 10 milhões que gerou, pode beneficiar de mais, porque estão ali saldos transitados de outras entidades”, acrescentou.
Segundo a antiga governante, isto permite “fazer face a uma gestão mais flexível”.
Lembrando que “o INEM já tinha devolvido saldos em 2016”, e questionada sobre os despachos de transferência de saldos do INEM que entraram em vigor antes da sua entrada em funções, afirmou: “admito que os despachos de início de 2020 o que fizeram foi antecipar devolução”, face ao aumento das despesas que seria previsível por causa da pandemia.
Defendeu ainda que a ideia que os saldos são propriedade das entidades “não é compatível com uma boa gestão anual”. “É por isso que há concentração de saldos na ACSS e é por isso que existem no Ministério das Finanças dotações para fazer face a receitas urgentes e inadiáveis”, acrescentou.
A ex-governante referiu que há sempre, na gestão orçamental anual, a possibilidade de “reforço do orçamento das entidades, por exemplo, para investimento” e disse que, relativamente ao INEM, nos anos em que exerceu funções, não teve qualquer “sinalização de necessidade de orçamento com dotação superior” justificando tal situação com “a cobrança de receita superior ao orçamentado e ainda mais superior relativamente à despesa efetuada”.
Cláudia Joaquim insistiu na ideia de que “quando são gerados saldos significa que a receita foi superior à despesa” e lembrou que os saldos do INEM rondaram os 14 milhões de euros em 2021, 12 milhões em 2022 e seis milhões em 2023.
Questionada sobre a utilização, denunciada pelo ex-presidente do INEM, de verbas para subscrição de títulos dívida pública, disse que a decisão foi da responsabilidade do conselho diretivo do instituto.
Já sobre a possibilidade de o Governo de que fez parte poder ter alterado a norma de 2015 (na altura da 'troika'), respondeu: “O Governo tem capacidade para alterar normas, mas não normas da lei do Orçamento do Estado”.
“Essas, só a Assembleia da República (…) e não me recordo de sugestões de alterações de redação desta norma em concreto, o que significa que não houve propostas [dos outros partidos] de alteração desta lógica de gestão orçamental”, concluiu.