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Covid-19: Países em desenvolvimento têm de pagar 2,3 biliões de dólares em dívida em 2020 e 2021 - UNCTAD

LUSA
23-04-2020 16:15h

A Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) estimou hoje que os países em desenvolvimento terão de pagar entre 2 a 2,3 biliões de dólares em dívidas só neste e no próximo ano.

Os países em desenvolvimento vão "bater numa parede de dívida durante esta década, e num contexto de circunstâncias profundamente problemáticas", porque só neste e no próximo ano os países em desenvolvimento de alto rendimento terão em dívida 2 a 2,3 biliões de dólares [1,8 biliões a 2,1 biliões de euros], e os de médio ou baixo rendimento deverão 700 mil milhões de dólares a 1,1 biliões de dólares [646 mil milhões de euros a 1 bilião de euros].

Os valores estão descritos no relatório que apresenta uma proposta abrangente para a crise da dívida que afeta os países mais vulneráveis no seguimento do abrandamento económico brusco determinado pelas medidas de combate à pandemia da covid-19, que expuseram as fragilidades já existentes.

O documento, que apresenta a mais abrangente proposta até agora feita pelas organizações internacionais sobre a gestão da dívida insustentável dos países mais vulneráveis, responde à expressão 'Grande Confinamento' usada pela economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI) para descrever a situação atual e acrescenta-lhe 'O Grande Descalabro', adotando o título 'Do Grande Confinamento ao Grande Descalabro: A Dívida dos Países em Desenvolvimento na Era da Covid-19".

Ao longo de 16 páginas, a UNCTAD passa em revista a evolução da dívida pública ou avalizada pelos Estados, para concluir que "no final de 2018 o total de dívida dos países em desenvolvimento era de 191%, quase o dobro do PIB, o maior nível de sempre".

A 'culpa', no entanto, não é atribuída aos devedores ou à má gestão das finanças públicas desses países, mas sim ao estado da administração do sistema financeiro mundial.

"A crise da dívida atual não era limitada aos países mais pobres, afetando as economias em desenvolvimento de todas as categorias de rendimento; no geral, não foi causada por má gestão interna de cada Estado, mas sim por má gestão económica e financeira a nível global", lê-se no relatório divulgado esta tarde em Genebra.

Desde a crise financeira de 2008 e 2009, os países em desenvolvimento viram o setor privado endividar-se aéá aos 139% do seu PIB combinado, "o que representa a maior ameaça às contas públicas em caso de uma crise financeira e de dívida total, que pode agora acontecer no seguimento da paragem brusca do refinanciamento devido à pandemia".

Comentando as propostas de suspensão dos pagamentos da dívida apresentadas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial e G20, o grupo das 20 nações mais industrializadas, a UNCTAD diz que isso, na verdade, não resolve o problema.

"Iniciativas como estas são bem-vindas porque dão margem orçamental para os países, mas não constituem qualquer tipo de alívio de dívida, antes pelo contrário; ao ligar [estas iniciativas] a novos ou atuais empréstimos, mesmo em termos concessionais, a iniciativa dá prioridades aos empréstimos concessionais, e portanto novas dívidas, ao alívio da dívida", argumenta a UNCTAD.

Para além disso, argumentam, aliviar a dívida até ao final do ano baseia-se numa "assunção heroica de que o choque da covid-19 às economias em desenvolvimento vai ser rápido e curto, e que o 'business as usual' vai retomar-se a partir de 2021, ano a partir do qual os países estarão em condições de pagar em três ou quatro anos a dívida de 2020.

O relatório da UNCTAD surge no seguimento de um conjunto de propostas feitas pelas instituições financeiras internacionais nas últimas semanas para tentar responder às dificuldades dos países em desenvolvimento para pagar as dívidas e, ao mesmo tempo, investir nos sistemas de saúde para conter a propagação da covid-19.

A nível global, segundo um balanço da AFP, a pandemia de covid-19 já provocou perto de 184 mil mortos e infetou mais de 2,6 milhões de pessoas em 193 países e territórios.

Cerca de 700 mil doentes foram considerados curados.

A doença é transmitida por um novo coronavírus detetado no final de dezembro, em Wuhan, uma cidade do centro da China.

Para combater a pandemia, os governos mandaram para casa 4,5 mil milhões de pessoas (mais de metade da população do planeta), encerraram o comércio não essencial e reduziram drasticamente o tráfego aéreo, paralisando setores inteiros da economia mundial.

Face a uma diminuição de novos doentes em cuidados intensivos e de contágios, alguns países começaram entretanto a desenvolver planos de redução do confinamento e em alguns casos, como Dinamarca, Áustria, Espanha ou Alemanha, a aliviar algumas das medidas.

Os Estados Unidos são o país com mais mortos (46.785) e mais casos de infeção confirmados (mais de 842 mil).

Seguem-se Itália (25.085 mortos, em mais de 187 mil casos), Espanha (22.157 mortos, mais de 213 mil casos), França (21.340 mortos, mais de 155.800 casos) e Reino Unido (18.738 mortos, mais de 138 mil casos).

Por regiões, a Europa soma mais de 114 mortos (mais de 1,2 milhões de casos), Estados Unidos e Canadá quase 49 mil mortos (mais de 882 mil casos), Ásia quase 7.500 mortos (mais de 182 mil casos), América Latina e Caribe mais de 6.100 mortos (mais de 122 mil casos), Médio Oriente perto de seis mil mortos (mais de 138 mil casos), África mais de 1.200 mortos (mais de 25 mil casos) e Oceânia 97 mortos (cerca de oito mil casos).

O número de mortes provocadas pela covid-19 em África subiu para 1.242 nas últimas horas, com quase 26 mil casos registados da doença em 52 países, segundo as estatísticas mais recentes sobre a pandemia naquele continente.

O “Grande Confinamento” levou o Fundo Monetário Internacional (FMI) a fazer previsões sem precedentes nos seus quase 75 anos: a economia mundial poderá cair 3% em 2020, arrastada por uma contração de 5,9% nos Estados Unidos, de 7,5% na zona euro e de 5,2% no Japão.

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