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Covid-19: Dicas para diminuir o risco de burnout parental

CANAL S+ / LP
20-04-2020 14:00h

Já passou mais de um mês desde que as crianças ficaram em casa. De repente, muitas mães e pais profissionais, tiveram de converter as suas vidas ao teletrabalho e reinventaram formas para continuarem a trabalhar e, simultaneamente, atenderem as necessidades dos seus filhos. No meio de todos estes desafios, físicos e psicológicos, como se pode evitar o burnout parental? Em entrevista ao S+, Maria Filomena Gaspar, docente na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (FPCEUC), deixa algumas dicas.

Numa fase em que vemos o isolamento ainda sem fim à vista, há muita gente a ficar cansada e a sentir que o esforço poderá já estar a causar algum impacto. É só mais um dia. Mais um. Mais um. Será que os jardins de infância vão abrir? Será que as creches vão abrir? Não abrindo, se tiver de ir trabalhar, como vai ser? Nesta situação tão atípica para todos, estas são apenas algumas perguntas que invadem os pais. O que importa ter em atenção são algumas dicas essenciais que, se ainda não colocou em prática, vai sempre a tempo.

Stress vs. Burnout parental

“O que temos de ter claro é que só 5% das pessoas é que desenvolvem burnout parental (…) a maioria das vezes o que sentem não é burnout, mas sim stress”, realça Maria Filomena Gaspar, também investigadora do consórcio International Investigation of Parental Burnout.

Nem sempre é fácil distinguir o stress do burnout, no entanto, Maria Filomena Gaspar, enumera três características que podem ajudar nesta tarefa: “o distanciamento emocional da criança, outro fator é a exaustão enorme, sentimento de esgotamento, sem energia. A terceira dimensão é que estes pais, quando pensam no que já foram e comparam com o que são, sentem que são péssimos pais, com baixa competências.”, acrescenta.

Dicas para evitar o burnout parental

- Os pais têm de baixar o nível de exigência consigo mesmos. Esqueçam o perfecionismo, isso não existe em parentalidade. Uma boa forma de esquecer o perfecionismo é questionar: Como é que até aqui foram no exercício das suas funções de pai e de mãe? Se até aqui conseguiram responder com qualidade às exigências da parentalidade, se conseguiram que as suas crianças se desenvolvessem adequadamente, então, papás, vocês vão continuar a ser capazes.

- Cuidado com aquilo que leem. Selecionem os conteúdos online porque, nesta altura, muitas são as instruções mas cada família tem a sua metodologia. Selecionem aquilo que faz sentido para vocês.

- A qualidade das relações com os filhos é muito mais importante do que a quantidade. Isto quer dizer que os pais não têm de estar sempre com os filhos, até porque as crianças precisam de espaço para se auto regularem, para serem capazes de estarem sozinhas e de gerirem o seu tempo e as suas emoções.

- É essencial organizar uma rotina para os filhos. Esta rotina aumenta a obediência da criança, que vai ver o seu dia organizado e, em contrapartida, o dia dos pais vai ser menos caótico. Tem de ser uma rotina com momentos para tudo: para as crianças relaxarem, para assistirem às aulas, serem capazes de estudar ou, se estiverem em idade pré escolar, para fazerem pequenas atividades plásticas, construções, etc. Depois disto tudo, é igualmente importante que tenha um momento de brincadeira, divertido e descontraído com o pai e com a mãe. Não se esqueçam: Esta não é a altura de quererem fazer tudo aquilo que não fizeram até agora!

- É importante ser flexível nesta altura. A rotina é necessária, logo que esta também possa ser flexível. Há regras da família que tem de ser reajustadas, como por exemplo, o tempo em que a criança está exposta ao ecrã. É importante que continuem a gerir este tempo, no entanto, é normal que, nesta altura de confinamento, os filhos estejam mais tempo ligados aos dispositivos móveis do que anteriormente. Tal também pode acontecer com o horário de deitar ou com o tempo para falar com os amigos. A rigidez, neste momento, é a inimiga da saúde mental dos pais.

-  Uma das formas de manterem as crianças ativas e de contribuírem para o seu desenvolvimento e responsabilidade é envolverem-nas em tarefas, desde muito pequeninas. As crianças podem levantar algo da mesa, logo que não haja o perigo de partir, e podem, entre outras coisas, ajudar a mãe ou o pai a tirar a roupa da máquina. Estas pequenas tarefas tornam a criança mais tranquila, mais responsável e claro, ajudam a reduzir o stress dos pais, nas múltiplas tarefas que têm nesta fase.

- Os pais devem encontrar uma maneira de ter tempo para eles. Muitos pais e mães estão em teletrabalho em casa. É pedido que tratem dos filhos, das tarefas domésticas e que, conciliem isto tudo, com o facto de serem professores, substituindo de algum modo a escola. Durante o dia, se houver pai e mãe em casa troquem de forma a que um fique com o filho, para que o outro faça aquilo que o faz sentir melhor: relaxar, ler um livro, fazer exercício, etc.

- O casal tem de encontrar um espaço para se “nutrir como casal”. Aproveite para fazer o pequeno almoço para o outro e, se tiver de ir às compras, compre um mimo para a cara metade. Quando um casal está em confinamento, este aumenta o nível de stress na relação, quer de coparentalidade, quer de conjugalidade. Preveja e previna este stress!

- Se, de repente, lhe apetecer fazer algo que não estava planeado, faça!

- Cuide dos filhos, mas não se esqueça de cuidar de si mesmo!

Após o confinamento

Segundo Maria Filomena Gaspar “há algumas coisas que podem ser antecipadas. No regresso à “normalidade”, é expectável que sinta uma crescente ansiedade, um aumento da angustia e irritabilidade. Podem sentir-se até um pouco perdidos, é normal”.

As relações conjugais foram postas à prova e, é natural que depois disto, muitas pessoas estejam a repensar se querem ou não continuar a sua relação conjugal, que antes disto podia já estar fragilizada. A professora da FPCEUC realça que “a história romântica de que o confinamento veio contribuir para as pessoas se aproximarem, é uma ilusão. Veio colocar mais pressão na relação e é normal que se estejam a questionar “É isto que eu quero?” Continuar nesta relação?”. O conselho que deixa é para que “esperem e evitem tomar decisões precipitadas depois deste confinamento. Deem um tempo a si mesmas. Não tomem decisões importantes depois do confinamento, esperem!”

Para as crianças, as dificuldades também vão existir porque “todos os momentos de transição têm o stress associado”. É normal que as crianças, depois deste confinamento, possam estar mais irritadas, mais desobedientes e híper estimuladas. Quando chegar este momento, vão precisar ainda mais de pais e mães com saúde mental, prontos para lhes darem estabilidade emocional e consistência.

É importante começar, desde já, a preparar as crianças para a mudança que se avizinha. Maria Filomena Gaspar deixa um exercício prático para fazer com as crianças mais pequeninas, “os pais podem falar com fantoches em que o fantoche é um menino que vai voltar para a escola” e fazer perguntas ao filho “Este menino vai voltar para a escola, o que achas que ele está a sentir?”. As crianças vão expor os seus próprios sentimentos e os pais devem analisar as respostas e trabalha-las com os filhos.

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