O governador do estado brasileiro de São Paulo, João Doria, criticou hoje a retórica do Presidente do país, Jair Bolsonaro, de desvalorização da pandemia do novo coronavírus, acusando o atual Governo de "desprezar vidas".
"O Brasil não pode parar para lamentar a irresponsabilidade de alguns que preferem desprezar vidas. Mais de 50 países estão em quarentena. É a pior crise de saúde no mundo. Quase metade da população do planeta está em casa. O mundo inteiro está errado? E o Presidente Jair Bolsonaro é quem está certo?", questionou ironicamente o governador daquele que é o estado mais rico e populoso do Brasil, assim como o mais afetado pela covid-19.
Durante uma conferência de imprensa na tarde de hoje, João Doria acusou o executivo brasileiro de divergir nas orientações enviadas à população.
"Há um documento do Ministério da Saúde pregando o isolamento. Há um decreto do Presidente da República defendendo o isolamento, decretando calamidade pública. Na campanha que o Governo está a lançar hoje é dito justamente o contrário. Afinal, temos um Governo Federal, ou dois Governos?” indagou Doria.
Na noite passada, Flávio Bolsonaro, filho do chefe de Estado e também senador publicou na sua conta do Facebook o vídeo de uma campanha do Governo, ainda em fase de planeamento, que usa o 'slogan' #BrasilNaoPodeParar, no qual pessoas representando trabalhadores de várias categorias defendem o regresso a um regime normal de trabalho.
O vídeo não foi oficialmente divulgado pelo Governo.
Na quinta-feira, o Governo brasileiro publicou, em Diário Oficial da União, a contratação por 4,9 milhões de reais (860 mil euros) de uma agência de publicidade sem licitação, com o objetivo de "disseminar informações de interesse público à sociedade, por meio de desenvolvimento de ações de comunicação".
Segundo Doria, o valor gasto na suposta campanha "deveria ser utilizado na compra de equipamentos de saúde e na comunicação correta aos brasileiros" acerca da pandemia do novo coronavírus.
“A política que mata pessoas, não salva a economia”, defendeu o governador de São Paulo, aconselhando os cidadãos a verificarem as recentes declarações do governante de Milão, Giuseppe Sala, que se mostrou arrependido por ter estimulado moradores da cidade a continuarem as atividades económicas e sociais durante a pandemia.
"Será que em São Paulo, e em outros estados do nosso país, vamos precisar enterrar 4.500 pessoas para ter a certeza de que o convite para irem às ruas, para fazerem o que não devem fazer, é um erro?”, acrescentou o governador.
Na terça-feira, Jair Bolsonaro gerou polémica junto da classe médica e política do Brasil ao pedir às autoridades estaduais e municipais a reabertura de escolas e comércio, e o fim do "confinamento em massa", de forma a evitar uma eventual "onda de desemprego".
Após ter-se oposto às declarações de Bolsonaro, João Doria sofreu ameaças de morte, tendo apresentado queixa na polícia.
Segundo o governador, esses ataques foram provenientes de apoiantes de Bolsonaro e do "gabinete do ódio" em Brasília, grupo difusor de 'fake news' (notícias falsas), que tem como alegados mentores o vereador Carlos Bolsonaro e o deputado Eduardo Bolsonaro, ambos filhos do atual chefe de Estado do Brasil.
"Não tenho medo do Bolsonaro, nem do 01, de 02, de 03 [expressão usada para identificar cada um dos filhos de Jair Bolsonaro]. Não tenho medo de 'bolsominion'[alcunha dos apoiantes de Bolsonaro]", afirmou Doria em conferência de imprensa.
Na quinta-feira, o Ministério da Saúde brasileiro anunciou 77 mortes e 2.915 infetados pela covid-19. São Paulo continua a ser o estado brasileiro mais afetado pela covid-19, contabilizando 58 mortos e ultrapassando os mil infetados, com 1.052 casos confirmados.
O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais 505 mil pessoas em todo o mundo, das quais morreram cerca de 23.000.