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Jovens recorrem mais à Linha SOS e duplicam casos de ideação suicida e autoagressões

LUSA
31-10-2025 16:19h

Os pedidos de ajuda através da linha SOS Criança e Jovem estão a aumentar, tendo duplicado os apelos que envolvem situações de ideação suicida ou comportamentos auto lesivos, revelou hoje o Instituto de Apoio à Criança (IAC).

“Temos mais jovens a entrar em contacto connosco”, disse à Lusa Maria João Cosme, coordenadora-adjunta do SOS Criança, serviço que tem registado um aumento de pedidos de ajuda relacionados com situações de bem-estar e saúde mental.

Em janeiro, por exemplo, os serviços receberam um total de 175 contactos, enquanto este mês dispararam para o dobro (333), entre telefonemas, e-mails, chat ou mensagens de WhatsApp.

Se os telefonemas e e-mails são mais usados por familiares e outros adultos que querem denunciar situações de risco, o WhatsApp é a escolha preferencial dos jovens, que se sentem mais à vontade a “escrever do que a falar dos seus problemas”, explicou Maria João Cosme.

E é precisamente no WhatsApp que se nota um maior aumento: Nos primeiros dois meses deste ano, a linha recebeu em média 25 contactos, enquanto nos dois últimos meses passou sempre a centena, segundo dados do IAC.

Olhando para os motivos que levam a contactar a Linha SOS Criança, o IAC destaca as situações de ideação suicida e os comportamentos autolesivos, que passaram de 47 pedidos de ajuda no ano passado para 95 casos, só este ano, quando ainda faltam contabilizar três meses.

A especialista acredita que o isolamento das crianças e o uso abusivo de ecrãs agravou os problemas, mas também admite que o aumento de casos registados possa estar relacionado com o lançamento da Linha SOS no WhatsApp.

“No WhatsApp temos mais adolescentes a entrar em contacto connosco e as temáticas versam mais sobre a depressão, a ideação suicida e o isolamento”, explicou.

Segundo Maria João Cosme, a violência e os maus tratos eram os problemas mais abordados até 2020, mas depois da pandemia de covid-19 a “temática começou a mudar e foi mais para a saúde mental”.

Em 2020, a Linha contabilizou 2.268 contactos. No ano passado foram 2.450 e este ano são já 2.522.

“Pode efetivamente haver um aumento de casos, porque a covid teve um impacto negativo na saúde mental, mas acredito que também tem a ver com a própria dinamização e divulgação dos nossos serviços”, disse.

Maria João Cosme sublinha que não se pode fazer uma extrapolação direta entre o número de contactos e os casos em risco, porque “podem ser os mesmos jovens”, uma vez que há muitos casos em que recorrem aos serviços “várias vezes e com a mesma temática”.

Também a psicóloga Tânia Gaspar alertou este mês para o aumento de comportamentos autolesivos, que já afetam um em cada quatro jovens em Portugal: "Crianças e jovens - e cada vez mais cedo - começam a ter comportamentos autolesivos, com ou sem objetivo suicidário, para lidar com o sofrimento psicológico".

A investigadora explicou que "nem todas as crianças apresentam os mesmos sintomas". Muitas tornam-se mais isoladas e tristes, mas outras mantêm uma vida social ativa, explicou a coordenadora em Portugal do estudo Health Behavior School Aged Children, promovido pela Organização Mundial da Saúde.

Também a pedopsiquiatra Neide Urbano alertou este mês para o aumento de adolescentes nas urgências por autoagressões ou tentativas de suicídio, defendendo consultas regulares de pedopsiquiatria de rotina para detetar precocemente sinais de riscos de saúde mental.

A especialista da Clínica da Juventude, serviço de pedopsiquiatria do Hospital de Dona Estefânia, em Lisboa, disse à agência Lusa que são os adolescentes, com uma média de idade de 15 anos, quem mais recorre ao serviço e à urgência hospitalar, sobretudo, por comportamentos autolesivos, suicidários ou não suicidários.

Entre os comportamentos não suicidários, os mais frequentes são cortes e outras formas de autoagressão, enquanto os suicidários envolvem sobretudo intoxicações medicamentosas voluntárias.

Para o IAC é urgente colocar a saúde mental das crianças e jovens como prioridade nas políticas públicas e no contexto escolar, assegurando recursos que consigam identificar sinais de sofrimento e dar respostas.

A Linha SOS Criança e Jovem, acessível através do número 116 111, oferece acompanhamento psicológico, social e jurídico a menores em situações de vulnerabilidade. 

Contactos de apoio e prevenção do suicídio:

Linha Nacional de Prevenção do Suicídio - 1411

SOS Voz Amiga 213 544 545, 912 802 669, 963 524 660

Conversa Amiga 808 237 327, 210 027 159

SOS Estudante 915 246 060, 969 554 545 ou 239 484 020.

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