A Ordem dos Médicos classificou hoje de “profundamente lamentável e miserável” a instrução do diretor executivo do SNS aos hospitais para reduzirem despesa em 2026, alertando que a medida pode prejudicar doentes e agravar listas de espera.
“Aquela que deveria ser a pessoa que defende o Serviço Nacional de Saúde acaba por se prestar a este papel lamentável, de estar disposto a hipotecar a resposta do SNS, a resposta assistencial, por causa de cortes orçamentais e de cortes orçamentais cegos que terão de ser feitos em 2026”, disse à agência Lusa o bastonário da Ordem dos Médicos.
Carlos Cortes reagia desta forma à notícia do Público, segundo a qual a Direcção Executiva do Serviço Nacional de Saúde, liderada por Álvaro Almeida, deu instrução aos hospitais para cortarem na despesa, mesmo que isso implique abrandar o ritmo crescente de cirurgias, consultas e outros cuidados de saúde.
Carlos Cortes disse que a Ordem dos Médicos já recebeu “algumas preocupações” de conselhos de administração devido a esta instrução do Diretor Executivo do SNS, considerando a sua postura “profundamente lamentável e miserável”.
“Se a indicação logo à partida é prejudicar os cuidados de saúde, então estamos logo à partida com um princípio profundamente errado, sobretudo de quem vem, que devia ser o primeiro a defender o acesso dos doentes ao Serviço Nacional de Saúde, e não a pôr como uma das hipóteses o sacrificar esses mesmos doentes”, vincou.
O bastonário lamentou que o diretor executivo do SNS se preste “a este papel profundamente nefasto” com um objetivo que é “uma missão impossível de poupar, cortar ainda mais, mesmo que isso venha a prejudicar os doentes e a aumentar as listas de espera””.
No seu entender, é uma medida inoportuna num momento “muito difícil” para o SNS, que atravessa “grandes dificuldades em várias áreas”, nomeadamente nas listas de espera que têm aumentado nas áreas das consultas, das cirurgias e oncologia.
Carlos Cortes recordou ainda as dificuldades diárias enfrentadas pelos profissionais e gestores hospitalares.
“Temos bem a imagem de alguém que não faz a mínima ideia das dificuldades que os profissionais têm no dia-a-dia para dar uma resposta aos doentes que recorrem ao SNS, nem das enormes dificuldades que os conselhos de administração têm para conseguir juntar as várias pontas, trabalhando muitas vezes em suborçamentação para o poder fazer”, criticou.
Para o bastonário, esta orientação coloca também “uma matéria ética”, uma vez que “a primeira missão do diretor executivo, dos conselhos de administração, dos profissionais de saúde, é tratar os doentes”.
“Obviamente que temos que respeitar o rigor orçamental, mas esse rigor orçamental também tem de se traduzir em maior eficiência do SNS, cortar em áreas que não impactam diretamente na resposta aos doentes”, defendeu.
Carlos Cortes comparou ainda o papel atual do diretor executivo ao de “um funcionário do Ministério das Finanças que olha para estas matérias de forma cega”, lembrando que a saúde “lida com vidas humanas, com pessoas em sofrimento, que precisam de cuidados de saúde”.
“Portanto, temos de desenvolver tudo que está ao nosso alcance para podermos tratar essas pessoas e não olhar para estas matérias somente como números, somente como dados orçamentais”, rematou.
Segundo o Público, a instrução terá sido dada pela Direcção Executiva do SNS numa reunião com dirigentes das unidades locais de saúde poucos dias depois de o Governo ter entregado a proposta do Orçamento do Estado do próximo ano na Assembleia da República.
A ordem é para reduzir os gastos com medicamentos, produção adicional (como as cirurgias fora do horário para aliviar as listas de espera), prestadores de serviço e contratações de pessoal, o que num contexto de procura crescente do SNS está a gerar preocupação e críticas.