A Associação Portuguesa de Bioética entregou hoje no parlamento um parecer com vista a alterar a lei para que os hospitais passem a ser obrigados a informar os doentes, aquando da admissão, da possibilidade de efetuarem um testamento vital.
“Volvidos quase oito anos após a legalização do Testamento Vital a maioria dos portugueses desconhece a sua existência”, salienta o presidente da Associação Portuguesa de Bioética (APB), Rui Nunes, citado em comunicado.
Rui Nunes é considerado o “pai” desta medida, que permite ao utente definir os cuidados de saúde que deseja ou não receber caso, por qualquer razão, se encontre incapaz de expressar a sua vontade pessoal e autonomamente.
Atualmente são cerca de 25 mil os registos existentes do Registo Nacional do Testamento Vital (RENTEV), o que, de acordo com o presidente da APB, se explica “pela falta de literacia em saúde da população, pela escassa mobilização de médicos e outros profissionais de saúde para a capacitação dos doentes e familiares, bem como a ausência de uma estratégia educativa na escola (…) e pela falta de uma estratégia que promova esta discussão em jovens na fase formativa da personalidade”.
Para aumentar o conhecimento da população sobre a existência do RENTEV e, consequentemente, fazer crescer o número de registos, no parecer entregue hoje ao vice-presidente da Assembleia da República, António Filipe, a APB propõe uma alteração da legislação de modo a determinar que, na admissão hospitalar, tanto no setor público, como no privado ou social, existam condições para que os utentes e suas famílias sejam adequadamente informados desta possibilidade.
De acordo com o presidente da APB, “não está aqui implícita a obrigatoriedade de todos os utentes efetuarem o seu registo, pois qualquer pessoa é, e será sempre, livre de querer ou não efetuar uma diretiva antecipada de vontade”.
“O que se pretende com esta alteração agora proposta à Casa da Democracia é que sejam criadas condições para a informação fluir com maior facilidade e assim chegar mais facilmente aos utentes dos hospitais portugueses”, adianta.
Rui Nunes assegura que esta medida não implica um significativo aumento de custos para o Ministério da Saúde, nem exige grandes alterações a nível organizativo: “Trata-se apenas de dotar o pessoal administrativo responsável pela admissão de doentes dos conhecimentos básicos para proceder a este tipo de informação, sinalizando o utente para um profissional de saúde quando se pretenda obter esclarecimentos adicionais sobre o tema”.
Para concretizar esta alteração, assegura Rui Nunes, “é suficiente utilizar algum tempo do pessoal administrativo bem como, complementarmente, elaborar um folheto explicativo onde conste uma descrição sumária das opções possíveis”.
“O sistema de saúde português tem a obrigação de se adaptar a uma evolução civilizacional ímpar da nossa sociedade, pelo que deve assumir a responsabilidade de contribuir para uma melhor formação da população portuguesa”, afirma Rui Nunes, sublinhando que, desta forma, se contribui “para o respeito dos direitos inalienáveis dos doentes à informação e ao consentimento”.
Em março do ano passado, foi publicada em Diário da República uma resolução da Assembleia da República que recomendava ao Governo que promovesse uma campanha de informação e divulgação que incentivasse ao registo do testamento vital.
O testamento vital é um direito de todo o cidadão maior de idade, que consiste em manifestar que tipo de tratamento e de cuidados de saúde pretende ou não receber quando estiver incapaz de expressar a sua vontade.