Duas crianças foram esta terça-feira tratadas, no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, com um medicamento inovador para a atrofia muscular espinal, uma doença genética rara que pode ser letal, e o tratamento "correu bem", informou a instituição.
"Correu muitíssimo bem", disse em conferência de imprensa a diretora do Departamento de Pediatria do Hospital de Santa Maria, Ana Isabel Lopes.
Se as doentes, duas bebés, continuarem a reagir bem, terão alta hospitalar na quarta-feira.
De acordo com a equipa médica, se as meninas responderem favoravelmente à medicação são esperadas as "primeiras melhorias" do seu estado clínico dentro de um mês, como levantar os braços, controlar a cabeça, ficar sentadas, melhoria da deglutição ou diminuição da ventilação respiratória.
O medicamento inovador - Zolgensma - não cura a doença, mas apresenta como "benefícios globais" o "bloqueio da progressão" da patologia, a "minimização de sequelas" e um "ganho na sobrevida e qualidade de vida" do doente, segundo a pediatra Ana Isabel Lopes.
Os efeitos secundários do fármaco a longo prazo são desconhecidos, uma vez que o medicamento "é muito recente", tendo sido testado nos Estados Unidos, onde foi aprovado em maio, com "poucos doentes" que foram seguidos durante quatro anos.
Por este motivo, também não é conhecida a duração da eficácia terapêutica do Zolgensma, que está a ser apreciado pela Agência Europeia do Medicamento. A autoridade portuguesa do medicamento (Infarmed) autorizou excecionalmente o seu uso pelo Hospital de Santa Maria para tratar as duas crianças.
Apesar das cautelas, existe "evidência clínica e experimental do benefício clínico acrescido" do medicamento inovador em relação a outros fármacos, sendo que quanto mais cedo for dado ao doente mais benefícios terá nele, assinalou Ana Isabel Lopes.
O medicamento Zolgensma foi administrado às duas meninas, que já estavam a ser acompanhadas no hospital, por reunirem os "critérios clínicos adequados", como serem doentes estabilizadas, nomeadamente em termos respiratórios e cardíacos.
Durante uma hora, as bebés receberam uma dose única do fármaco, uma solução administrada nas veias.
"É como ter soro a correr, mas em vez de soro é o medicamento", esclareceu a neuropediatra Teresa Moreno.
Nos próximos três meses, as crianças terão uma "vigilância apertada", que inclui a realização de análises periódicas. Um dos "efeitos adversos" transitórios que poderão ocorrer são "alterações hepáticas" (no funcionamento do fígado).
A par disso, as menores terão de continuar a ser seguidas nas consultas de rotina.
O uso excecional do Zolgensma, em Portugal, no tratamento das duas meninas foi desencadeado com o caso de uma delas, a bebé Matilde, cujos pais lançaram com sucesso uma campanha de angariação de fundos nas redes sociais para comprar o medicamento, no valor de dois milhões de euros.
O fármaco, que acabou por não ter custos diretos para os pais, foi pago pelo Estado e dado à Matilde, mas também à Natália.
No mercado português já há, devidamente aprovado, um outro medicamento, o Spinraz, que retarda igualmente a progressão da doença, mas não é de dose única.
De acordo com a Sociedade Portuguesa de Neuropediatria, a atrofia muscular espinal é uma doença degenerativa neuromuscular, que não afeta a função cognitiva, sendo a principal causa genética de morte.
A doença pode levar à morte (ou à dependência de ventilação 24 horas por dia) de uma criança antes dos 2 anos quando os sintomas se manifestam antes dos 6 meses, e aos quais estão associados a diminuição da força muscular, as dificuldades no controlo da cabeça e na deglutição e a insuficiência respiratória precoce.