Associações de apoio aos sem-abrigo enfrentam dificuldades, com redução de pessoal e escassez de alimentos e materiais de proteção, devido à epidemia Covid-19, e receiam não conseguir dar resposta a esta população que está “com medo de ser abandonada”.
“Até ao dia de ontem [segunda-feira] conseguimos manter o apoio às pessoas sem-abrigo e hoje esperamos contar com voluntários para levar a cabo essa missão”, disse à Lusa a diretora geral da Comunidade Vida e Paz, Renata Alves, louvando o trabalho “incansável” dos voluntários que permitem assegurar quatro voltas diárias de distribuição de comida pelas mais de 430 pessoas que ajudam na rua.
Renata Alves afirmou que houve uma redução de profissionais e de voluntários, incluindo pessoas pertencentes à faixa de risco para a epidemia causada pelo novo coronavírus, mas ainda assim tem sido possível manter as rotinas.
No entanto, foi já elaborado um plano de contingência que prevê que se não conseguirem o número de voluntários necessários, o número de voltas pela cidade será reduzido, para três ou duas, conforme for possível.
“As pessoas [sem-abrigo] estão com medo, sentem-se abandonadas e precisam que as estruturas consigam continuar a ir ao encontro das suas necessidades. Estão informadas e respeitam as indicações de prevenção e segurança, mas estão com medo que as instituições deixem de ir até elas”, disse.
A pensar nestas dificuldades, foi elaborado um plano, em articulação com a Câmara Municipal de Lisboa (CML) e com as associações CASA e a Noor Fátima, para partilhar recursos e otimizar os meios.
O objetivo é que juntamente consigam manter o apoio concentrado, ou seja, o CASA e a Noor Fátima – que também distribuíam refeições nas ruas – passam a entregar as refeições que confecionam na Comunidade Vida e Paz, que assegura as rotas e a distribuição.
Também o diretor de serviços do CASA, Nuno Jardim, afirma que para já ainda conseguem fazer a distribuição alimentar, mas reconhece que estão com falta de recursos por causa dos voluntários que suspendem o trabalho, uma situação que considera perfeitamente normal e compreensível, dado o risco de propagação do vírus.
Assegura, contudo, que todos os meios de segurança e higiene estão a ser acautelados, com o uso de desinfetantes, máscaras e proteções próprias, manutenção das distancias de segurança, escalas feitas com equipas alternadas, e até os próprios alimentos distribuídos são agora acondicionados em sacos pré-preparados e individuais.
Segundo a informação distribuída pelo CASA aos seus colaboradores, no final de uma reunião com a CML, na segunda-feira, de onde saiu o plano de trabalho futuro, a associação ainda dispõe de luvas e liquido desinfetante, mas as máscaras estão esgotadas.
No entanto, segundo a mesma informação, a que a Lusa teve acesso, a CML vai entregar kits de proteção, com máscaras e aventais, e vai ajudar na compra de produtos alimentares.
Além desta ajuda, está previsto a autarquia alojar os sem-abrigo em alguns locais, como o Pavilhão do Casal Vistoso, no Areeiro, que começa hoje a receber o primeiros sem-abrigo.
“Hoje vai ser ativado o Pavilhão do Casal Vistoso, como uma estrutura extra, um centro de acolhimento extraordinário”, para as pessoas em situação de sem-abrigo que não são acompanhadas nos centros de acolhimento existentes, disse à Lusa o assessor do vereador dos Direitos Sociais, Manuel Grilo.
Trata-se de um pavilhão com capacidade para cerca de 40 pessoas, que irá receber apenas homens, para evitar potenciais casos de agressão sexual, pelo que as famílias, mulheres e casais irão para outros espaços mais adequados, afirmou.
Nesses centros, a população sem-abrigo terá acompanhamento médico, refeições, mantas, pode trocar de roupa, fazer a sua higiene e dormir.
À partida é uma medida pensada apenas para a noite, mas que poderá passar a assegurar respostas 24 horas por dia, caso seja declarado o estado de emergência, e de acordo com os critérios que forem definidos nessa altura.
No âmbito deste plano de contingência está também prevista a adaptação de um espaço disponível para centro de isolamento para casos suspeitos entre pessoas sem-abrigo e a abertura de um centro de acolhimento de emergência para eventuais novos casos entre esta população.
Já a Associação Cais, “não tem respostas de intervenção de emergência, pelo que não tem uma equipa de rua a trabalhar diretamente com pessoas em situação de sem-abrigo”, refere em comunicado.
No entanto, está presente nas redes das cidades de Lisboa e Porto que reúnem várias organizações de solidariedade social que trabalham com esta população e garante que vai continuar a seguir o que está a ser feito e disponível para qualquer ação concertada que for decidida tomar, em conjunto.
O centro Cais Porto está encerrado desde segunda-feira, até 13 de abril, podendo os utentes ser acompanhados por telefone, ao passo que o de Lisboa mantém-se aberto, mas apenas para casos “muito urgentes e imprescindíveis”, devendo os restantes der acompanhados por telefone.
Quanto às vendas da revista Cais nas ruas estão suspensas também desde segunda-feira, e até ao final do mês de abril.
A edição de abril será disponibilizada para todos em formato digital no ‘site’ da Cais, pelo que a associação apela a que todas as contribuições, “essenciais para a maioria dos seus vendedores”, sejam feitas para o IBAN PT50.0036 000099105891576.59.