SAÚDE QUE SE VÊ

Clínicas de proximidade em Lisboa fazem quase 6.000 consultas a população carenciada

LUSA
07-09-2025 05:00h

As duas clínicas de proximidade abertas em 2024 no bairro do Armador e na Alta de Lisboa, em Lisboa, fizeram quase seis mil consultas de clínica geral, nutrição e enfermagem, numa população carenciada em que mais de metade não tem médico de família.

As clínicas fazem parte do Projeto +Saúde, que envolve os Serviços Sociais da Câmara Municipal de Lisboa e a empresa municipal Gebalis, numa iniciativa que acaba por preencher algumas lacunas de acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS).

No total, as duas clínicas de proximidade, que abriram em março (Bairro do Armador) e maio (Alta de Lisboa) do ano passado, fizeram 2.296 consultas de clínica geral, mais de 470 de nutrição e mais de 3.000 de enfermagem.

Na Unidade de Cuidados de Saúde Primários (UCSP) do Bairro do Armador estão inscritas mais de 22.000 pessoas, mais de metade (13.173) não tem médico de família. Na Alta de Lisboa a situação é mais complexa e menos de 30% dos 37.560 inscritos na UCSP Santa Clara e Lumiar têm médico de família atribuído.

Em ambas são oferecidas a esta população, que morava em diversos bairros degradados abrangidos por programas de realojamento, consultas de clínica geral, enfermagem e nutrição.

“As pessoas têm dois tipos de desfavorecimento: um económico-financeiro e outro de falta de conhecimento”, nomeadamente sobre nutrição, disse à Lusa o diretor clínico dos Serviços Sociais da Câmara Municipal de Lisboa, Rui Julião, apontando a relação entre a pobreza e a maior carga de doença.

Apesar de inicialmente estranharem as consultas de nutrição, acabaram por aderir e hoje a taxa de presença é superior a 80%.

O responsável destaca ainda o “sucesso na área da enfermagem”, onde os utentes podem gratuitamente medir a tensão, a glicose ou fazer pensos de feridas ou de cirurgias.

A clínica do Bairro do Armador tem um médico para consultas de clínica geral três dias por semana, uma enfermeira três dias/semana e uma nutricionista um dia/semana e a da Alta de Lisboa um médico de clínica geral dois dias/semana, uma enfermeira dois dias/semana e uma nutricionista um dia por semana.

O investimento inicial de instalação (equipamentos, secretárias, cadeiras e consumíveis) no Armador foi de 21.000 euros e a despesa de funcionamento anual 78.000 euros e na Alta de Lisboa o investimento inicial foi de 35.000 euros e as despesas para a autarquia no primeiro ano de funcionamento foi de 60.000 euros.

Com a taxa de presença nas consultas de clínica geral a ultrapassar os 90% , Rui Julião diz que as clínicas podem ainda atender mais utentes em todas as áreas e admite uma “evolução qualitativa”, por exemplo, para levar a nutrição às escolas, alargando-a também à saúde materno-infantil.

“No fundo, trata-se de uma educação para criar hábitos saudáveis”, afirma.

Adepto do serviço público de saúde, Rui Julião defende que se deve avançar para uma “verdadeira municipalização da saúde”, que diz ser a única forma de melhorar o acesso da população a cuidados de saúde: “É no acesso que tudo se determina, determina-se o presente e o futuro”.

“Na Alta de Lisboa tínhamos um centro de saúde aqui a metros e não tinha médicos. Acabavam por mandar as pessoas para a clínica da câmara, como era conhecida, e acabámos por ter aqui pessoas de zonas que não eram abrangidas pela clínica”, que tem como função dar serviços básicos de saúde às pessoas mais desfavorecidas.

Sublinha que os números da falta de médicos de família nos dois bairros “são avassaladores” e que mesmo muitas das pessoas que tinham médico de família não conseguiam acesso: “Aqui, além do médico e da enfermagem, têm a prescrição médica pelo SNS e a hipótese de prescrição de exames também pelo SNS”.

João Carmona, médico responsável pelas consultas de clínica geral no Bairro do Armador, em Marvila, sublinha a dificuldade de acesso desta população aos cuidados de saúde: “é uma população carente, muito envelhecida e que necessita com urgência tanto do centro de saúde como da unidade de saúde familiar, que não têm médicos [disponíveis). Os poucos que têm estão sobrecarregados”.

O médico, que trabalha há mais de 40 anos e conhece a freguesia, lembra que está permanentemente a crescer e que as características desta população tornam ainda mais urgente a resposta de saúde em proximidade.

“As pessoas não têm consultas, pois são difíceis de marcar, (…) e estas unidades vieram colmatar um pouco esta necessidade de acesso, nem que seja para a medicação”, afirmou o responsável, sublinhando ainda a brecha na resposta mais urgente deixada pelos antigos serviços de atendimento permanente, o que obriga as pessoas a procurarem muitas vezes resposta nas urgências hospitalares.

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