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Covid-19: África toma medidas "drásticas" para conter propagação no continente menos afetado

LUSA
17-03-2020 15:05h

Muitos países africanos tomaram medidas drásticas nos últimos dias para evitar que a Covid-19 se espalhe incontrolavelmente pelo continente, que até agora é o menos afetado pela epidemia, com 400 casos de infeção registados e apenas dez mortes.

"Esperamos não atingir o número de infeções registadas na Europa. Os sistemas de saúde em África são muito frágeis e seria desastroso", disse à agência espanhola, Efe, por telefone, o diretor do Centro de Controle e Prevenção de Doenças em África (CDC), Ahmed Ogwell.

"É verdade que o número de infeções está a aumentar, mas em geral é um ou dois por dia, não demasiados ao mesmo tempo", continua Ogwell, chefe desta instituição da União Africana com sede em Adis Abeba, Etiópia.

Tal como Orgwel, vários especialistas esperam que o ataque da Covid-19 em África seja menos duro do que noutros continentes, em primeiro lugar porque o tráfego aéreo para aquela zona do globo é menor em comparação com o resto do mundo, e depois pela experiência que o continente africano tem em conter epidemias como a de Ébola, cólera ou febre de Lassa, entre outras.

"Mas é verdade que ninguém sabe o que vai acontecer amanhã" em relação a uma epidemia que já gerou mais de 7.000 mortes - quase metade delas na China, a origem da doença - e mais de 180 mil pessoas infetadas em todo o mundo, , admitiu aquele responsável.

Em contraste, os 54 países africanos registam pouco mais de 400 casos e dez mortes confirmadas oficialmente, apesar de muitos suspeitarem que os números reais poderão ser bem mais elevados, dada a escassez de testes e o controlo de informação por parte dos governos.

"Nós não temos mais casos porque não estamos a testar. Não vamos retardar a propagação a menos que tomemos medidas radicais", afirmou a médica etíope Senait Fisseha, conselheira do diretor-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS).

Em caso de dúvida, as grandes potências africanas - vibrantes pontos de tráfego com a Europa e a Ásia - tomaram medidas drásticas nas últimas 48 horas, incluindo proibições de viagens, revogações de vistos ou encerramento de locais de culto religioso.

O Quénia, com três casos confirmados, proibiu no domingo a entrada de viajantes de qualquer país afetado pela Covid-19, e juntamente com o Gana, Senegal, Ruanda e Etiópia - entre outros países - ordenou o encerramento de escolas e proibiu qualquer reunião pública.

Até hoje, a Covid-19 chegou a 30 países africanos, com quatro casos recentes confirmados na segunda-feira na Somália, Libéria, Tanzânia e Benim, que, como quase todos os anteriores, trata-se de pessoas oriundas da Europa e da Ásia ou africanos que visitaram recentemente aqueles continentes.

O Presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, decretou no domingo o estado de calamidade nacional e anunciou - a partir de quarta-feira - a proibição de visitantes dos EUA, Reino Unido, Itália e outros países de alto risco, bem como o encerramento de escolas e a proibição de concentrações de mais de 100 pessoas, a fim de evitar um aumento dos 62 casos de infeção registados até agora no país, o maior número no continente, só ultrapassado pelo Egito (mais de 160).

Outros países também impuseram medidas rigorosas para combater o vírus, como Marrocos, que decretou o encerramento do espaço aéreo e o fim dos voos comerciais para todos os destinos do mundo, além do encerramento de escolas, cafés, restaurantes, cinemas, teatros e todos os locais de entretenimento, ou a Argélia, que na segunda-feira suspendeu as ligações aéreas e marítimas com todos os países europeus.

Se a situação piorasse drasticamente nas próximas semanas, como aconteceu na Europa, os funcionários e o pessoal médico receiam que o sistema de saúde, já precário em muito dos países, se desmorone e que as mortes se multipliquem.

No total, são 43 os países do continente capazes de realizar um número muito limitado de testes de coronavírus, de acordo com dados do CDC africano, que no último mês deu formação em muitos Estados africanos sobre vigilância, prevenção e gestão clínica.

No entanto, o secretário-geral da União Nacional de Enfermeiros do Quénia, Seth Panyako, disse à agência espanhola Efe que os enfermeiros, profissionais na primeira linha de contacto com casos suspeitos de coronavírus, não dispõem de equipamento de proteção adequado.

Além disso, o facto de mais de 60% dos 1,2 mil milhões de africanos viverem em bairros clandestinos, segundo dados da UN-Habitat, significa que uma grande parte da população urbana pode ter dificuldade em implementar medidas de quarentena ou de distanciamento social.

Um medo que se estende a áreas de conflito - como o centro e sul da Somália sob o controlo do grupo jihadista 'Al Shabab' - campos de refugiados no Sudão do Sul, na Bacia do Lago Chade ou no norte do Quénia e, em geral, em qualquer lugar onde "ficar em casa" é quase uma quimera.

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