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Cabo Verde "não pode ficar indiferente" à mutilação genital feminina – estudo

Lusa
06-02-2025 16:13h

Cabo Verde não pode ficar indiferente à mutilação genital feminina, mesmo sem ser comum, mas por ser praticada por muitos imigrantes, alertou hoje a autora de um estudo que recomenda recolha de dados e formação.

"Cabo Verde já não pode ficar indiferente porque nós recebemos muitos imigrantes e muitos são de países onde essa cultura está enraizada", afirmou Deisa Semedo, investigadora da Universidade de Cabo Verde (Uni-CV), durante a apresentação do trabalho, a propósito do Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina (MGF), que hoje se assinala.

A autora recomendou que sejam recolhidos dados sobre o assunto e apresentou os resultados de um inquérito a 55 pessoas.

Alguns profissionais de saúde e outros participantes apontaram para uma "falta de conhecimentos sobre a mutilação genital feminina", tornando-se mais difícil haver "cuidados de qualidade a meninas e mulheres que recorrem às diferentes unidades de saúde", disse.

As primeiras reações dos profissionais de saúde ao tema são de "espanto, surpresa e constrangimento", o que reflete o desconhecimento e a falta de formação.

O estudo foi conduzido no último ano em quatro ilhas com maior concentração de imigrantes: Sal, Boa Vista, São Vicente e Santiago.

Entre os inquiridos, encontram-se profissionais de saúde, mulheres e membros de associações de imigrantes, bem como de instituições nacionais e vítimas de MGF que residem em Cabo Verde.

Na ilha do Sal, a mais turística do país, os profissionais de saúde demonstraram maior familiaridade com o tema, o que poderá estar relacionado com a significativa presença de imigrantes.

O objetivo do levantamento preliminar é abrir caminho para um estudo de prevalência da MGF, “que poderá dar mais indicadores”, referiu Deisa Semedo.

"Identificamos casos de mulheres de imigrantes que têm bastante medo de deixar uma filha ir de férias com o pai, porque corre riscos” de se tornar numa vítima de MGF, exemplificou.

No inquérito, quatro mulheres relataram complicações causadas pela mutilação: depressão, dores nas relações sexuais, complicações no parto e discriminação por parte de profissionais de saúde.

A presidente da Alta Autoridade para a Imigração (AAI) de Cabo Verde, Carmem Barros, assinalou o papel da legislação sobre Violência Baseada no Género (VBG), que criminaliza a prática no arquipélago.

"Estamos a falar de uma problemática que envolve múltiplas áreas, saúde, género, educação e imigração, exigindo, por isso, uma abordagem transversal", apontou.

A responsável disse ainda haver trabalho da instituição junto das comunidades imigrantes para desmistificar as razões da MGF e sensibilizar a sociedade cabo-verdiana para evitar generalizações ou preconceitos.

Outra das preocupações passa pela “formação dos profissionais de saúde para que possam identificar e sinalizar eventuais casos", disse.

"É um dos projetos que queremos implementar já este ano", concluiu.

Os projetos sobre o tema envolvem a Uni-CV, através do Centro de Investigação do Género e Família (CIGEF), e a AAI, com financiamento do Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP).

O Dia Internacional da Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina celebra-se anualmente a 06 de fevereiro, pela erradicação da prática que lesa a saúde física e psicológica de mulheres em todo mundo.

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