A confederação Oxfam relatou que o colonialismo permanece em África e acentua as desigualdades mundiais através da divisão, sob um olhar racista, entre um Norte evoluído e um Sul em desenvolvimento.
"O mundo atual continua colonial em muitos aspetos" e exemplo disso é o facto de se continuar a extrair a riqueza do "Sul Global para os 1% de super-ricos do Norte Global a um ritmo de 30 milhões de dólares [cerca de 29 milhões de euros] por hora", salientou a Oxfam, na introdução do seu relatório "De quem toma e não de quem marca: A pobreza injusta e a riqueza não merecida da herança colonial", numa tradução livre para português.
Na opinião da entidade, esta situação tem de ser invertida e "há que indemnizar aqueles que foram brutalmente escravizados e colonizados".
Esse custo deve ser suportado pelas pessoas mais ricas. Só em 2024 "a riqueza dos bilionários aumentou acentuadamente, com um ritmo de crescimento três vezes mais rápido do que em 2023", explicou.
"O nosso sistema económico, que é um colonialismo contemporâneo - conhecido por neocolonialismo -, tem de se tornar radicalmente mais igualitário para acabar com a pobreza", criticou.
Só os países do G7 (Estados Unidos da América, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá) ainda detêm 41% dos votos no Fundo Monetário Internacional (FMI) e no Banco Mundial, apesar de terem menos de 10% da população mundial. Por exemplo, um cidadão belga de classe média tem 180 vezes mais poder de voto no Banco Mundial que um etíope também de classe média, segundo a Oxfam.
Entre 1970 e 2023, os governos do Sul pagaram 3,3 mil milhões de dólares (cerca de 3,2 mil milhões de euros) em juros aos credores do Norte. No entanto, ainda hoje, a Oxfam estima que, por cada dólar que o FMI encorajou um conjunto de países pobres a gastar em bens públicos, disse-lhes para cortarem quatro vezes mais através de medidas de austeridade, lamentou.
As pessoas que vivem na pobreza em todo o mundo continuam a enfrentar múltiplas crises, sendo que os conflitos, nomeadamente em África, ainda as acentuam mais, gerando fome e desigualdades.
Atualmente, a esperança média de vida dos africanos é ainda inferior em mais de 15 anos à dos europeus, frisou.
A pandemia da covid-19 deixou "cicatrizes sob a forma de dívidas impagáveis, salários mais baixos e preços dos alimentos muito mais elevados", salientou.
O colonialismo é um fenómeno histórico e contemporâneo. Atualmente, quase sessenta anos após o fim do período colonial histórico, a nossa economia global continua "claramente estruturada para que a riqueza flua do Sul para o Norte e, mais especificamente, das pessoas comuns do Sul para as pessoas mais ricas do Norte", segundo o estudo.
Pela primeira vez, em 2023, mais novos bilionários enriqueceram por herança do que por empreendedorismo. A América Latina é a região com o maior volume de riqueza herdada do mundo, mas apenas nove países da região tributam heranças, presentes e propriedades, nomeadamente o Brasil, a Colômbia, o Uruguai e a Argentina.
As desigualdades começam cedo, no sistema educativo, que, segundo a Oxfam, tem "frequentemente as marcas e sustenta o legado colonial através do domínio do conhecimento e das línguas ocidentais e das disparidades globais na investigação e no financiamento".
Os processos de independência não se traduziram em lutas por igualdade uma vez que muitos governantes tenderam a manter os sistemas económicos e políticos desiguais existentes, que os enriqueciam, criticou.
"Na África do Sul [país vizinho de Moçambique], os sul-africanos brancos continuam a ganhar três vezes mais do que os seus homólogos negros, quase 30 anos após o fim do 'apartheid'", exemplificou.
De uma forma geral, "embora as formas explícitas de exploração racista, como a escravatura, tenham sido abolidas, o legado do racismo estrutural persiste em todo o mundo e reflete-se nos resultados ao nível da educação, do emprego, dos serviços sociais, das finanças e da saúde", segundo a Oxfam.
Por exemplo, a mortalidade materna das mulheres negras é atualmente quase quatro vezes superior à das mulheres brancas no Reino Unido, citou.
As grandes empresas multinacionais dominam as cadeias de abastecimento globais, beneficiando de mão-de-obra barata e da extração contínua de recursos do Sul.
África detém uma parte substancial das reservas minerais mundiais, em especial as necessárias para produzir tecnologias como as baterias para veículos elétricos e as turbinas eólicas. No entanto, o continente continua pobre e 43% da sua população não tem acesso à eletricidade, sublinhou.
A Oxfam é uma confederação internacional de 21 organizações para combater as desigualdades, acabar com a pobreza e a injustiça, concluiu.