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Veredito do caso Pelicot proferido na quinta-feira no sul de França

Lusa
18-12-2024 13:53h

O Tribunal de Avignon, no sul da França, vai proferir na quinta-feira o veredito no julgamento histórico de múltiplas violações a Gisèle Pelicot sob sujeição química, com os 51 arguidos sujeitos a penas até 20 anos.

O Ministério Público pediu a 27 de novembro a pena máxima de 650 anos de prisão pelo total dos crimes de violação e agressão sexual contra a vítima de 72 anos, que se tornou um símbolo feminista mundial por ter decidido tornar o julgamento público e assistir às sessões com o rosto descoberto “para que a vergonha mude de lado”.

A pena mais longa pedida e o máximo contemplado pela lei em França são 20 anos de prisão para o ex-marido e 'cérebro' do plano, Dominique Pelicot, de 72 anos, que desde o início do julgamento reconheceu todos os factos e garantiu que a sua fantasia era “subjugar uma mulher insubordinada”.

O principal arguido violou Gisèle Pelicot, drogando-a com grandes doses de ansiolíticos, que a deixaram inconsciente e perto do coma, segundo os peritos médicos que testemunharam no início do julgamento, para que fosse ainda violada por dezenas de homens recrutados na Internet.

Os factos em julgamento ocorreram entre 2011 e 2020, primeiro na região de Paris e, a partir de 2013, na casa para onde o casal Pelicot se mudou quando ambos se reformaram, situada em Mazan, uma aldeia de 6.000 habitantes perto de Avignon.

As provas de todos os crimes foram encontradas pela polícia em mais de 20.000 vídeos e fotografias presentes no computador de Dominique em 2020, depois de ter sido detido por filmar por baixo das saias de mulheres num supermercado, que levaram os investigadores a contar 72 violadores, sem conseguir identificar todos.

“Eles me viam como uma boneca de pano, como um saco de lixo”, disse Gisèle Pélicot no tribunal, onde afirmou estar a lutar por "todas as pessoas ao redor do mundo, mulheres e homens, que são vítimas de violência sexual".

Outro arguido, Jean-Pierre Maréchal, admitiu no julgamento a autoria dos crimes, embora nunca tenha tocado na vítima, mas replicou os métodos de Dominique com a sua própria mulher, que também foi violada sob o efeito de ansiolíticos pelos dois homens.

A pena mais baixa pedida pela acusação, quatro anos, é para outro homem que é apenas acusado de agressão sexual, sem qualquer acusação de violação, por apenas “tocar” em Gisèle Pelicot.

Os restantes arguidos, com idades compreendidas entre os 27 e os 74 anos, enfrentam pedidos de condenação que vão de 10 a 20 anos de prisão por violação agravada.

“Haverá um antes e um depois”, declarou a procuradora do Tribunal Penal de Avignon, Laure Chabaud, durante as audiências, consciente da importância deste processo.

Em França, o Código Penal define a violação como “qualquer ato de penetração sexual de qualquer tipo ou qualquer ato oral-genital cometido contra outra pessoa” com “violência, obrigação, ameaça ou surpresa”.

Durante o julgamento, Laure Chabaud apelou a uma “consciencialização real e profunda da noção de consentimento” para os arguidos e para a sociedade em geral, já que a noção de consentimento não aparece no sistema jurídico francês e, para que a violação seja criminalizada, tem de haver penetração.

Por esta razão, as estratégias de vários advogados de defesas basearam-se na tentativa de elaborar argumentos sobre as práticas sexuais dos arguidos, com Gisèle a ter de negar ter compactuado com o plano do seu ex-marido, fingido dormir ou ter participado voluntariamente.

Dominique Pelicot é também acusado em dois outros casos de violência de género, um pela violação e homicídio de uma mulher em 1991 e outro por uma tentativa de violação em 1999.

Os ativistas contra a violência sexual esperam que os cinco juízes do tribunal considerem sentenças de prisão exemplares, vendo o julgamento como um possível ponto de viragem na luta contra a cultura de violação e a submissão química.

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