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Organização japonesa Nobel da Paz 2024 alerta que "tabu nuclear" pode ser quebrado

Lusa
10-12-2024 14:10h

A organização antinuclear japonesa Nihon Hidankyo alertou hoje, ao receber o Prémio Nobel da Paz em Oslo, para a crescente ameaça de quebra do “tabu nuclear” e instou o mundo a trabalhar para a eliminação das armas atómicas.

“Estou infinitamente entristecido e furioso por se estar a ameaçar quebrar o tabu nuclear”, disse o copresidente e secretário-geral da Nihon Hidankyo, Terumi Tanaka, que destacou a Rússia por insinuar a sua possível utilização na Ucrânia e Israel na Faixa de Gaza.

Tanaka recordou que existem 4.000 ogivas nucleares operacionais em todo o mundo e que os seus danos potenciais seriam “milhares de vezes” superiores aos de Hiroshima e Nagasaki.

Por isso, reclamou a ação de todos os governos e argumentou contra a ideia de dissuasão nuclear, além de instar mais países a aderirem ao Tratado sobre a Proibição de Armas Nucleares de 2017.

Tanaka, de 92 anos, tinha 13 anos quando os Estados Unidos lançaram duas bombas atómicas sobre Hiroshima e Nagasaki (a sua cidade natal), matando cerca de 210.000 pessoas, enquanto outras 400.000 sofreram danos pela radioatividade, recordou na cerimónia na Câmara Municipal de Oslo, presidida pelo Rei Harald V e pela Rainha Sónia da Noruega.

Com poucas recordações da deflagração, só três dias mais tarde, quando ia com a mãe descobrir o destino dos seus familiares no centro de Nagasaki, é que viu a “devastação total”, que resultou na morte de vários dos seus familiares.

“Todas as casas ao longo da estrada, até à base da montanha, estavam completamente queimadas e os corpos espalhados à sua volta. Muitas pessoas gravemente feridas ou queimadas, mas ainda vivas, foram deixadas sem assistência, sem ajuda. Quase fiquei sem emoções, bloqueando o meu sentido de humanidade”, relatou Tanaka.

Os ‘hibakusha’ (sobreviventes) foram “forçados ao silêncio pelas forças de ocupação durante sete anos” e “abandonados” pelo Governo japonês, “isolados”, sofrendo de doenças, “sofrimento”, “preconceito” e “discriminação”, recordou o ativista nonagenário.

Tanaka lembrou ainda que foram os testes atómicos norte-americanos no Atol de Bikini, em 1954, que deram início a um movimento anti-nuclear e motivaram o nascimento, em 1956, da Nihon Hidankyo, que desde então se dedica a divulgar os testemunhos das vítimas, a exigir indemnizações e a lutar contra as armas nucleares.

“A idade média dos sobreviventes da bomba atómica é de 85 anos. Dentro de dez anos, apenas alguns poderão depor como testemunhas diretas. Espero que as novas gerações encontrem formas de continuar os nossos esforços e desenvolver o movimento”, disse Tanaka.

No seu discurso, o presidente do Comité Nobel norueguês, Jørgen Watne Frydnes, avisou que o mundo entrou numa era nuclear “mais instável” e que o alerta “é mais urgente do que nunca”, lamentando que nenhuma das nove potências nucleares pareça “interessada” no desarmamento nuclear e no controlo de armas.

Dirigindo-se aos ‘hibakusha’, disse: “Não se resignaram à condição de vítimas, definiram-se como sobreviventes. Recusaram-se a ficar em silêncio enquanto as potências nos conduziam a longos períodos de armamento nuclear. Levantaram-se e partilharam o vosso testemunho pessoal único com o mundo. Uma luz na noite mais escura, um caminho a seguir, vocês dão-nos esperança”.

Frydnes também instou as autoridades da Bielorrússia e do Irão a libertarem “imediatamente” os ativistas presos Ales Bialiatski e Narges Mohammadi, galardoados com o Prémio Nobel da Paz em 2022 e 2023, respetivamente.

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