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Covid-19: Constitucionalistas defendem alteração à Lei de vigilância em saúde pública

LUSA
07-05-2021 17:15h

Os constitucionalistas Vieira de Andrade e Reis Novais defenderam hoje que se deve alterar a Lei de vigilância em saúde pública para permitir medidas restritivas em situações de pandemia sem recurso ao estado de emergência.

Num painel de debate sobre "A defesa dos direitos e das liberdades em estado de emergência", inserido num colóquio comemorativo do 45.º aniversário da Constituição da República Portuguesa organizado pelo Tribunal Constitucional, José Carlos Vieira de Andrade considerou que "seria bom evitar a banalização do estado de emergência".

"Isso poderia ser feito, julgo, através da alteração da Lei do sistema de vigilância em saúde pública, uma alteração limitada, naturalmente, não é preciso ser uma alteração total, para adequar as regras existentes às necessidades", acrescentou o professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.

Jorge Reis Novais, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, concordou que "a solução" é fazer "uma alteração cirúrgica, pontual, à Lei de vigilância em saúde pública, uma lei parlamentar que diga em termos pode o Governo ou não restringir direitos fundamentais, limitar direitos fundamentais nestas circunstâncias, distinguir isso caso a caso".

"E em segundo lugar, e tão ou mais importante, a forma que deve revestir o ato do Governo e que em princípio só deveria ser uma forma legislativa, coisa que atualmente não acontece", completou.

No entender de ambos os constitucionalistas, nem a Lei de Bases da Proteção Civil nem a Lei que institui um sistema de vigilância em saúde pública são adequadas para situações de pandemia.

Vieira de Andrade referiu que "neste momento a atuação do Estado está a ser regulada neste aspeto por estas duas leis, e aquilo que se diz é que se houver problemas volta-se ao estado de emergência", concluindo que está em causa "a preocupação de uma legitimação formal".

Segundo o professor da Universidade de Coimbra, o artigo 19.º da Constituição, que estabelece o estado de emergência como instrumento para suspensão do exercício de alguns direitos, liberdades e garantias, "teve em vista sobretudo casos em que o bem que estava em causa era a própria ordem pública" e "não tanto situações em que o inimigo é um vírus e em que o bem constitucional, o bem comunitário a proteger é a saúde pública".

Compreende-se que numa fase inicial "a solução pragmática fosse o estado de emergência e não a alteração legislativa", mas agora "já não se percebe tão bem que não haja uma legislação própria e adequada, que a alternativa seja sempre voltar ao estado de emergência", afirmou Vieira de Andrade.

"Não vale tudo em termos de emergência e julgo que seria bom que não fosse preciso o estado de emergência para limitar os diretos na medida em que isso seja necessário para assegurar, neste caso, a luta contra a pandemia e, portanto, o restabelecimento da normalidade. Devia haver a possibilidade de definição de um quadro legislativo adequado para que pudéssemos responder a estas situações sem necessidade de recorrer ao estado de exceção", reforçou.

Reis Novais observou que "hoje toda a gente reconhece a necessidade dessa lei", mas que no plano político essa alteração legislativa foi remetida para depois da pandemia de covid-19.

"Se estas leis não servem ou são insuficientes ou são inaplicáveis, não há nada a fazer até ao fim da pandemia?", questionou.

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