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Presidente do Serviço de Dependências alerta para violência contra profissionais

LUSA
17-01-2020 18:29h

Os casos de violência exercida por utilizadores de drogas contra profissionais de saúde deixaram de ser uma raridade devido a uma alteração dos consumos, alertou hoje o presidente do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD).

“Hoje em dia, com uma muito maior predominância de estimulantes e de perturbações mentais com alguma gravidade a elas associadas, essas situações de violência começaram a ocorrer com maior intensidade”, disse João Goulão num evento na Câmara de Lisboa, no qual o presidente da autarquia, Fernando Medina, anunciou que a capital portuguesa vai acolher em setembro a conferência internacional Fast-Track Cities 2020.

No evento, o especialista contou que uma instituição que desenvolve “um trabalho meritório junto da comunidade” lhe transmitiu que, “fruto das alterações de padrões de consumo e das substâncias consumidas entre a população utilizadora de drogas”, os episódios de violência que no passado eram uma raridade começaram a acontecer

À margem da iniciativa, João Goulão disse à Lusa que esta situação se deve a “um maior consumo de cocaína e a uma degradação das condições de saúde mental de muitos dos utilizadores”.

“Enquanto a população objeto da nossa intervenção era sobretudo utilizadora de opiáceos, nomeadamente heroína, tínhamos quase invariavelmente uma colaboração e uma cordialidade na relação entre os utilizadores e os profissionais, mas com os episódios de desorganização mental, causada pelos estimulantes, acontece ainda que esporadicamente, mas vão acontecendo, algumas situações que podem pôr em risco a integridade dos profissionais”, explicou.

Nas últimas semanas, lembrou, tem-se ouvido “vários relatos de episódios de agressões a profissionais de saúde, noutros contextos que não têm nada a ver com as drogas”, ou pelo menos julga-se que não, “mas é importante que tenhamos consciência de que esta é uma realidade e que é importante proteger a integridade das pessoas que dão o melhor de si no dia a dia para ajudar os nossos concidadãos”.

Segundo o responsável, as agressões acontecem principalmente contra os profissionais que estão nas equipas de tratamento e nas carrinhas de distribuição de metadona, onde "há uma maior proximidade com pessoas, eventualmente, mais desorganizadas” a nível mental, disse, adiantando que são sobretudo pessoas com percursos mais prolongados de utilização de droga.

Estas situações fizeram “tocar as campainhas” e “congregar as forças policiais” para apoiar de forma ainda mais efetiva, para dissuadir este tipo de comportamento sem que “isso tenha a contrapartida de afastar e afugentar os utentes das respostas”, sublinhou.

No evento, foi discutida a necessidade das Fast-Track Cities seguirem políticas de drogas baseadas no conhecimento para reduzir novas infeções por VIH, respeitando os direitos daqueles que usam drogas.

O Relatório sobre Drogas da Onusida reconhece que, enquanto novas infeções por VIH entre adultos tiveram mundialmente um declínio de 14% entre 2011 e 2017, não houve uma diminuição no número anual de novas infeções por VIH entre aqueles que injetam drogas.

Mas em Portugal, entre 2008/2017, houve uma descida de 93% nos casos de VIH nesta população, segundo o Programa Nacional VIH/SIDA, para a qual contribuíram as políticas de redução de danos.

“As políticas de drogas devem focar-se na redução de danos, em vez de alimentar o estigma associado à criminalização do uso de drogas”, defendeu Fernando Medina.

O presidente do International Association of Providers of AIDS Care, José Zuniga, afirmou, por seu turno, que “onde se aplicam políticas de drogas corretas e se disponibilizam serviços de redução de danos, como em Portugal”, observa-se “um decréscimo significativo de infeções por VIH” nesta população.

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