Os estados que investem mais em saúde e respetivos recursos humanos apresentam melhores taxas de adesão à terapêutica para a hipertensão arterial, que em Portugal é de 54,6%, revela um estudo que envolveu 31 países diferentes.
“O que concluímos é que a adesão à terapêutica custa dinheiro, os países que têm maior investimento em saúde têm também uma maior taxa de adesão à terapêutica na área da hipertensão arterial”, disse hoje o coordenador da investigação, promovida pelo CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde com a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP).
Em declarações à Lusa, Paulo Santos lembrou que a hipertensão arterial “continua a ser o maior determinante de morte do mundo inteiro, ou seja, o maior fator de risco de mortalidade”, defendendo, por isso, a necessidade de atuar “em função dos determinantes que existem e dos problemas que são identificados”.
“Podemos continuar a apostar na abertura de unidade coronárias e na abertura de unidade de acidente vascular cerebral (AVC), ou podemos apostar em prevenir, a montante, numa maior cobertura do que são os hipertensos e daquilo que é o seu tratamento, para não termos a necessidade de mandar estes doentes para os AVC ou para o enfarte agudo de miocárdio, que são as grandes doenças relacionadas com a hipertensão”, sublinhou.
Comparando o sul com o norte da Europa, “temos uma esperança média de vida com saúde à volta dos 60 anos, a Dinamarca e a Noruega têm uma esperança média de vida com saúde à volta de 70 anos. Esta diferença de 10 anos tem também muito a ver com o investimento em saúde e nos recursos humanos em saúde”, frisou.
Em seu entender, numa perspetiva de sustentabilidade, “Portugal deve decidir se quer continuar a investir na doença e a pagar o prejuízo da doença ou se quer, de facto, investir na saúde e na prevenção da doença”.
“O facto de puxar a vida com saúde para a frente 10 anos significa um investimento em toda uma população produtiva. É preciso decidir se queremos continuar a ter um ministério da doença que gere, sobretudo, a sustentabilidade dos hospitais ou se queremos começar a ter um ministério, um ministro da Saúde, que olha para os determinantes de saúde e vai melhorar o estado da população”, acrescentou.
O trabalho, intitulado “Medical Adherence in Patients with Arterial Hypertension: The Relationship with Healthcare Systems’ Organizational Factors”, avaliou a adesão ao tratamento dos doentes com hipertensão arterial em 31 países, incluindo Portugal, e concluiu que apenas 55% dos doentes toma os medicamentos conforme a prescrição do médico.
Verificou-se, contudo, que a adesão varia muito em todo o mundo, desde apenas 11% na Indonésia até 85% na Austrália.
Entre os motivos que poderiam interferir na adesão, foram estudados os determinantes relacionados com a organização dos sistemas de saúde, designadamente o número de profissionais de saúde (médicos, enfermeiros e farmacêuticos), o tempo de consulta e a despesa feita na saúde.
“Encontrámos como determinantes de uma maior adesão à terapêutica o número de profissionais de saúde existentes e o investimento público e total em saúde”, revela o estudo, publicado no jornal científico Patient Preference and Adherence.
O número de médicos surge, neste contexto, como o fator organizacional mais “preponderante” na adesão à terapêutica. “Pensamos que o maior número de médicos facilita o acesso aos cuidados de saúde, bem como um seguimento mais apertado, contribuindo para um maior envolvimento dos doentes no seu próprio tratamento”, explicam os investigadores.
Também o número de enfermeiros, que desempenham um papel importante no controlo da pressão arterial e na educação dos doentes, demonstrou ter uma relação positiva com o grau de adesão. Já o número de farmacêuticos não pareceu ter um papel significativo a este nível, deixando um espaço de melhoria para a sua intervenção neste problema.
Os investigadores salientam que não se comprovou a existência de relação entre a duração da consulta e o grau de adesão à terapêutica nos hipertensos. Por outro lado, a adesão aparece positivamente associada ao investimento em saúde.
“Não basta prescrever mais medicamentos: É importante perceber porque é que os doentes não aderem aos tratamentos e reduzir a não adesão, encontrando a melhor estratégia para cada indivíduo. Este estudo foca os fatores relacionados com a organização e estrutura dos serviços de saúde, chamando a atenção para a responsabilidade de promover condições que permitam maximizar o potencial de saúde das pessoas”, afirmam os autores do estudo.
A hipertensão arterial é o principal determinante de mortalidade no mundo inteiro, estimando-se que contribua para cerca de 7,5 milhões de mortes por ano. A Organização Mundial de Saúde (OMS) define a hipertensão com valores de pressão arterial iguais ou superiores a 140/90 milímetros de mercúrio (mmHg) e calcula que a doença atinja cerca de 22% da população adulta.
Em Portugal, um estudo recente mostra que está presente em 42% dos adultos.