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Covid-19: Têxtil português quer assumir-se como "cluster" no setor da saúde

LUSA
15-04-2020 15:58h

O setor têxtil português quer assumir-se como ‘cluster’ produtor de artigos para o setor da saúde, um segmento “de futuro” onde várias empresas se estrearam para abastecer o Serviço Nacional de Saúde (SNS) durante a pandemia de covid-19.

“Este é um ‘cluster’ de futuro, não tenho dúvidas. E então, se nos cadernos de encargos dos concursos públicos se introduzir uma cláusula de que pelo menos 50% da produção tem de ter origem europeia, vai ser um grande incentivo e uma garantia de que vai haver um mercado que garante a sobrevivência das empresas que investirem na produção destes artigos”, afirmou o presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal (ATP) em declarações à agência Lusa.

De acordo com Mário Jorge Machado, foram “muitas dezenas” as empresas têxteis portuguesas que, face à escassez de equipamentos de proteção individual no SNS para lidar com a situação gerada pelo novo coronavírus, “se adaptaram rapidamente” e redirecionaram a atividade para a produção de materiais como máscaras, batas e outros dispositivos médicos.

Esta rápida resposta da indústria nacional acabou por resultar na constituição de um potencial ‘cluster’ nesta área, cujo efetivo desenvolvimento pode representar uma nova área de negócio para o setor têxtil e de vestuário português.

Por outro lado, sustentou o dirigente associativo, a aposta na produção europeia deste tipo de dispositivos médicos poderá evitar situações de escassez como a atual: “O objetivo é que não volte a repetir-se o que está a acontecer agora, em que queremos alguns produtos de proteção básicos e tem de vir tudo da Ásia, porque as infraestruturas da indústria na Europa desapareceram devido à desindustrialização”, afirmou Mário Jorge Machado.

Segundo o dirigente associativo, o impacto do surto de covid-19 no setor têxtil português vai traduzir-se numa queda “próxima dos dois dígitos” da produção e das exportações já no mês de março, mas o pior ainda está para vir em abril.

“No mês de abril a quebra vai ser de dois dígitos, mas já com um impacto enorme”, antecipou, avançando que os contactos mantidos pela ATP com os associados apontam para um recuo “na ordem dos 40, 50 ou mesmo 60%” do volume de negócios do setor têxtil nacional.

“São números com proporções muito grandes, números como nunca vimos nas nossas exportações de um mês para o outro”, admitiu, sustentando que “se uma quebra de 10% já é dramática, uma quebra na ordem dos 50% é algo que, sem as ajudas desenhadas [pelo Governo], seria insuportável para as empresas”.

Neste cenário, Mário Jorge Machado considera que “a grande questão em termos de futuro” é conseguir “por a economia a funcionar” o mais rapidamente possível, sem com isso comprometer o combate à pandemia, assumindo aqui um papel “crítico” a utilização da denominada “máscara social”.

“Este é sem dúvida um dos grandes temas que pode fazer a diferença em termos de a retoma económica ser muito mais rápida. Porque termos a oportunidade de ir ao exterior sem medo de contagiar ou de sermos contagiados vai fazer toda a diferença no nosso comportamento social e isso consegue-se com a utilização de máscaras”, sustentou.

Salientando que também aqui “a indústria têxtil tem capacidade de responder ao desafio”, o presidente da ATP nota que “não é preciso que todos usem máscaras cirúrgicas, mas sim máscaras que garantam proteção adequada em espaços públicos”, surgindo as máscaras em tecido, reutilizáveis e certificadas pelo centro tecnológico do setor (o Citeve), como a solução.

“Ao conseguir produzir máscaras que se podem lavar e reutilizar, o setor têxtil faz uma diferença enorme relativamente às máscaras que hoje existem, quer do ponto de vista da sustentabilidade, quer do ponto de vista do custo por utilização”, afirma.

Neste sentido, avançou, o Citeve está a trabalhar com a Direção-Geral da Saúde (DGS) e o Infarmed (Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde) com vista à certificação de máscaras reutilizáveis em tecido, sendo que “a grande maioria da indústria têxtil portuguesa tem capacidade instalada para as produzir, quer para Portugal, quer para exportação para o resto da Europa”.

“E isto sim – sustenta Mário Jorge Machado - pode fazer a grande diferença entre uma recuperação mais rápida ou mais lenta da economia”.

“Se todos pudermos usar uma máscara adequada para estarmos em espaços públicos sem contaminarmos nem sermos contaminados, em vez de estarmos todos confinados em casa, podemos fazer uma vida praticamente normal e por a economia a funcionar, porque o sistema não aguenta estarmos todos fechados meses à espera que apareça uma vacina”, afirmou.

A nível global, a pandemia de covid-19 já provocou quase 127 mil mortos e infetou mais de dois milhões de pessoas em 193 países e territórios. Mais de 428 mil doentes foram considerados curados.

Em Portugal, morreram 599 pessoas das 18.091 registadas como infetadas.

A doença é transmitida por um novo coronavírus detetado no final de dezembro, em Wuhan, uma cidade do centro da China.

Para combater a pandemia, os governos mandaram para casa quatro mil milhões de pessoas (mais de metade da população do planeta), encerraram o comércio não essencial e reduziram drasticamente o tráfego aéreo, paralisando setores inteiros da economia mundial.

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