O Partido Socialista (PS) quer ouvir a bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC), Paula Franco, no parlamento para perceber como é que os bancos estão a apresentar às empresas as linhas de crédito disponibilizadas pelo Governo.
Em declarações à agência Lusa, João Paulo Correia, vice-presidente do grupo parlamentar do PS, adiantou que o partido ia apresentar ainda hoje um requerimento nesse sentido, que será votado esta quinta-feira.
O objetivo, adiantou o deputado, é chamar a bastonária à Comissão de Orçamento e Finanças para saber “como é que os bancos estão a transmitir as linhas de crédito criadas pelo Governo às empresas que procuram esse apoio” para combater o impacto económico da pandemia de covid-19.
“Sabe-se que os contabilistas são as pessoas melhor colocadas para transmitir aquilo que é a relação entre as empresas e a banca e sabemos que a OCC enviou uma carta a todos os seus filiados, alertando para o facto de os bancos estarem a exigir documentação que a Ordem considera que não é uma exigência legal à luz dos critérios das regras destas linhas de crédito”, sublinhou João Paulo Correia.
Além disso, referiu, os deputados têm “recebido queixas das empresas sobre a forma como a banca procura ir além das regras das linhas de crédito, como as taxas de juro praticadas e a substituição de crédito vigente, visto que o novo crédito tem garantia do Estado. Ou seja, os bancos aproveitam-se para limpar os rácios de capital à conta da fragilidade do país por causa da crise sanitária”, criticou.
Na quinta-feira serão ainda votadas audições ao governador do Banco de Portugal (BdP) e aos cinco maiores bancos a operar em Portugal (Caixa Geral de Depósitos, Millennium BCP, Santander Totta, BPI e Novo Banco), mas o PS acredita que os esclarecimentos da bastonária podem ser importantes, para saber “que informação estão a receber das empresas relativamente ao comportamento e à conduta dos bancos”, neste âmbito.
“Queremos saber se as linhas de apoio estão a chegar a todas as empresas, nomeadamente às micro e pequenas, e de que forma está a chegar”, além de “questionar se as queixas que estamos a receber correspondem ou não à verdade” e se há um “comportamento abusivo dos bancos”, referiu João Paulo Correia.
Ainda no início da crise, o Governo anunciou linhas de crédito no valor de 3.000 milhões de euros, com garantia de Estado, destinadas a suprir dificuldades de tesouraria de empresas.
Contudo, associações empresariais e fontes do setor financeiro indicaram que o valor é muito escasso face às grandes necessidades e que se esgota rapidamente.
O Governo pediu já à Comissão Europeia autorização para aprovar novas linhas de crédito, no valor global de 7.000 milhões de euros.
Neste processo têm sido criticados os encargos desses créditos para as empresas.
Apesar de o 'spread' (margem de lucro comercial do banco) ser entre 1% e 1,5%, os restantes encargos podem fazer com que o custo total supere os 3%, o que as empresas consideram excessivo neste contexto, até porque os bancos se financiam no Banco Central Europeu (BCE) a taxas negativas (-0,75%).
Já fontes do setor financeiro afirmam que deviam ser encontrados outros instrumentos de financiamento das empresas, incluindo linhas a fundo perdido, referindo que os pequenos negócios (que correspondem a grande parte do tecido económico, como cafés, cabeleireiros, mecânicos) mesmo com empréstimos a 0% de juros teriam muita dificuldade em ter de futuro rendimentos para os pagar.
Referem ainda que para os bancos levantarem dinheiro no BCE têm de ter colateral para servir de garantia.
Houve ainda informações de que os bancos estariam a usar as linhas de crédito Covid para reduzir crédito malparado de clientes. Em comunicado, a semana passada, o presidente do BCP disse que "práticas dessa natureza seriam absolutamente inaceitáveis".