A Cooperativa do Povo Portuense suspendeu a reabilitação da casa habitada por um doente de Alzheimer e sua mulher, em Vila Nova de Gaia, “com o argumento da covid-19”, tendo-se gorado hoje uma tentativa de solucionar o problema.
A informação foi avançada à agência Lusa por Sofia Figueiredo, da Associação Portuguesa de Pessoas com Demência, que tem acompanhado o caso e que descreveu o que se passa como “um ato de crueldade”, sublinhando que o casal se mantém a viver “sem condições mínimas de habitabilidade e confinado a uma sala”, desde 17 de março.
O caso reporta-se a uma habitação degradada de Canidelo, Vila Nova de Gaia, no distrito do Porto, coabitada por um doente de Alzheimer, de 61 anos, e pela sua mulher e cuidadora, Manuela Cunha, de 55 anos, que, também em declarações à agência Lusa, se limitou a referir que responsáveis da cooperativa “deram hoje a cara e fizeram promessas”.
As promessas consistiram, segundo Sofia Figueiredo, em fornecer materiais para alguns trabalhos, que seriam executados por pessoas amigas do casal, e pelo protelamento de outros trabalhos a executar sob orientação direta da cooperativa.
Para Sofia Figueiredo, trata-se de uma solução “inaceitável” já que o casal está “sem água e sem luz e com muito entulho acumulado” na residência.
A fonte contou que a situação habitacional do casal foi exposta, em 27 de dezembro de 2019, no blogue “A anarquia das Palavras”, num texto em que se apelava à ajuda popular, através do fornecimento de materiais de construção para uso na reabilitação da casa.
“Ficou claro que não se pretendia dinheiro, mas sim materiais de construção”, sublinhou Sofia Figueiredo, para assinalar que foi a própria Cooperativa do Povo Portuense que se ofereceu para realizar a obra, já que os seus responsáveis tinham visto o apelo e tinham ficado sensibilizados.
“Mas, pasme-se, após terem partido as paredes, deixado este casal sem água e sem luz e com muito entulho acumulado decidiram não concluir a obra com o argumento da covid-19”, afirmou.
Contactado pela agência Lusa, o presidente da cooperativa, Paulo Jorge Teixeira, confirmou que a instituição que dirige se voluntariou para recuperar a habitação, no âmbito de um programa que designa por SAAL-2 (uma espécie de sucedâneo do Serviço Ambulatório de Apoio Local do pós-25 de Abril), depois de conhecer a situação habitacional do casal.
“Renovamos casas de pessoas sem publicidade em troca. Ao longo dos últimos anos já fizemos 20 ou 30 intervenções em casas, pequenas intervenções, que acabam por melhorar a qualidade de vida das pessoas. Foi o que aconteceu com este caso”, disse.
Confirmou também que a cooperativa fez um pequeno arranjo na casa e decidiu avançar para uma “intervenção mais profunda”, que obrigou ao realojamento temporário do casal noutro local.
Segundo Paulo Jorge Teixeira, a pandemia levou o casal a regressar a casa e também a cooperativa a suspender os trabalhos.
“Não podíamos continuar a obra naquelas condições. As pessoas que temos a fazer esse trabalho foram retiradas à rua e não podíamos correr o risco de infetar quem lá está, até porque também tem condições de saúde precárias”, alegou.
Paulo Jorge Teixeira disse existirem várias outras dificuldades a contornar para se prosseguir os trabalhos, entre elas a retirada dos entulhos por causa dos ecopontos cheios.
“Mas se for preciso metemos o entulho nas nossas instalações. Aquelas pessoas mereciam e continuar a merecer uma intervenção profunda na sua casa”, assinalou.
O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais de 1,4 milhões de pessoas em todo o mundo, das quais morreram mais de 82 mil.
Em Portugal, segundo o balanço feito hoje pela Direção-Geral da Saúde, registaram-se 380 mortes, mais 35 do que na véspera, e 13.141 casos de infeções confirmadas, o que representa um aumento de 699 em relação a terça-feira.
Portugal, onde os primeiros casos confirmados foram registados no dia 02 de março, encontra-se em estado de emergência desde as 00:00 de 19 de março e até ao final do dia 17 de abril.