SAÚDE QUE SE VÊ

DOS DIAS

Todos fazíamos uma pequena ideia de que isto não iria ser pera doce. Conviver e partilhar algumas dezenas de metros quadrados, 24 horas por dia, sempre com as mesmas pessoas e rotinas, será, talvez, o maior teste a todas as nossas capacidades sociais e pessoais. É uma experiência avassaladora e pode tornar-se destruidora se não nos acautelarmos.
Tudo custa. Tudo.

A hora mudou este fim de semana e dei por mim a pensar, “olha que bom, tudo o que preciso agora é de uma hora a mais para aguentar!”. Quem não?
Tenho sempre o refúgio do teletrabalho mas, até isso se tornou numa tarefa demasiado difícil, especialmente porque, por um par de semanas, os miúdos deixam de ter aulas e já todos percebemos que vem por aí mais tempo livre para os disparates e ideias mirabolantes, agora que não há um horário escolar para cumprir.

Tentei abstrair-me deste pensamento enquanto estendia mais uma máquina de roupa. Impossível, a amostra do fim de semana já deixou bem claro o calvário que vai ser até à Páscoa.

Peguei no telemóvel e consultei uma pasta, que alimento frequentemente, com mil sugestões para fazer em casa. Foi interessante. Produtivo, até. Sentei os miúdos e fomos até ao Vaticano. Uma visita virtual à Capela Sistina. Ficou prometido que, quando tudo passar, iremos ver os frescos ao vivo. Expliquei-lhe que é ali onde se fecham os cardeais quando têm de eleger um Papa. Encerram-se ali por horas, tal como nós estamos agora. Curiosamente, no domingo vi o Papa, sozinho, na Praça de São Pedro. Não pude deixar de sentir a tristeza da solidão daquele homem. E a minha, também.

Telefonei aos meus. Todos bem, felizmente. Jogámos às cartas, os miúdos implicaram uns com os outros e ameacei que ficavam de castigo se não se portassem bem. Não portaram. E eu não me zanguei. Mas zanguei-me ao fim de ouvir a música do Titanic, pela quarta ou quinta vez. Em flauta! Ninguém merece e eu só queria ver o Dirty Dancing e recordar aquele friozinho na barriga que sentia sempre que o Jonny e a Bebé dançavam.

Descobri que temos pokémons em casa. Que é difícil capturá-los. O meu filho diz que o truque é atirar a bola na direção deles e não arremessar-lha às cabeças, como tenho feito.

Encomendei um vestido de lantejoulas não sei para quê nem para quando o usar. Se sobreviver a isto, mentalmente falando, jurei que será a primeira coisa que levarei à rua. A insanidade destes dias já mo permite. E eu sempre gostei de ser diferente.