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COVID-19: Instituto de Medicina Molecular testa novo coronavirus

Canal S+ VD
27-03-2020 17:51h

O Instituto de Medicina Molecular (IMM) João Lobo Antunes da Universidade de Lisboa reuniu os seus investigadores e, de forma voluntária, vai realizar 300 testes por dia de despiste ao coronavírus.

Em entrevista ao S+, Miguel Castanho, 53 anos, é um dos investigadores portugueses a dirigir um dos laboratórios do Instituto de Medicina Molecular (IMM) João Lobo Antunes da Universidade de Lisboa, e que melhor conhece o funcionamento de coronavírus, como é o caso do SARS-COV 2. O bioquímico congratula-se com o trabalho extraordinário que o IMM fez coletivamente em apenas uma semana. As equipas observaram o protocolo dos testes de despiste do COVID-19 e constataram que se tratavam de técnicas que usam quotidianamente e que, por isso, podiam dar o seu contributo e assim aumentar a testagem e despiste na população portuguesa. Após validação do INSA – Instituto Nacional Ricardo Jorge – o IMM está já a fazer nesta primeira fase 300 testes por dia, mas pode vir a fazer mais.

 Miguel Castanho recorda as palavras do 32º Presidente dos Estados Unidos da América para enaltecer o espírito de sacrifício, mas também de dádiva coletiva, de todos os investigadores e cientistas do IMM envolvidos. 

Em 2002-2003 quando a Ásia foi atingida pelo surto de SARS, o bioquímico Miguel Castanho integrou equipas de investigadores internacionais que estudaram o vírus na origem da doença, o SARS-COV 1. Na altura, a comunidade internacional e a indústria farmacêutica, bem como universidades e laboratórios de todo o mundo dedicaram tempo e dinheiro na busca de uma vacina e de um tratamento eficaz. Infelizmente, quando começaram a surgir no horizonte as primeiras soluções, houve um súbito desinteresse e todo o trabalho ficou suspenso. Uma perda tremenda para o mundo que agora, em 2020, já podia ter uma solução para a pandemia ou pelo menos uma aproximação de solução. Segundo o cientista, todos os meios humanos e técnicos que estiveram no combate ao SARS-COV 1 estão agora a ser reativados para dar resposta ao novo coronavírus, até porque geneticamente, o SARS-COV 1 e o SARS-COV 2 têm semelhanças que atingem os 80%, explica o “group-leader” do IMM.

 

Hoje, com mais de 500 mil pessoas infetadas em todo o mundo pelo novo coronavírus, grupos de cientistas e investigadores trabalham dia e noite, sempre em rede, partilhando os avanços e recuos com os seus pares, na busca de uma solução eficaz. Como tudo em Ciência não há “milagres” de um dia para o outro, pelo que a primeira coisa que se fez foi testar medicamentos dirigidos a outras patologias. É um caminho “seguro” dado que já se conhecem os efeitos secundários e toxicológicos desses medicamentos.  Em Israel, por exemplo, descobriu-se que um medicamento anti-malária estaria a produzir efeitos “interessantes” nos infetados com o COVID-19. Miguel Castanho é cauteloso nos comentários, mas esclarece, que para os investigadores vai ser um grande desafio perceber como é que um fármaco destinado a combater um parasita se está a mostrar eficiente na luta contra um coronavírus.

Na verdade, um pouco por todo o planeta testam-se soluções e ensaiam-se caminhos para travar o avanço da pandemia que já vitimou mais de 25 mil pessoas e infetou 540 mil. Um deles é o recurso a anti-retrovirais, maioritariamente utilizados contra o HIV. O bioquímico Miguel Castanho, estudioso do Vírus da Imunodeficiência Humana, garante que os resultados não são promissores, mas também estão a ser feitos testes todos os dias com outros medicamentos como é o caso dos anti-gripais.

Se em Israel a solução encontrada foi um farmáco anti-malária, do Japão chega um outro medicamento que a própria China já reconheceu e utilizou em pacientes infetados em Wuhan – epicentro inicial da pandemia – e em Shenzen. De uma amostra de 340 doentes chineses infetados com o novo coronavírus, o “Favipiravir” ou “Avigan” mostrou uma evolução positiva em apenas 4 dias de terapêutica com efeitos positivos em 91% contra 62% dos indíviduos que não tiveram acesso ao medicamento. Ainda assim, o Ministério da Saúde Japonês já veio explicar que nem sempre o fármaco funciona bem quando o COVID-19 já se multiplicou no organismo.

 Perante o avanço avassalador da pandemia COVID-19 para mais de 200 países, o bioquímico Miguel Castanho defende que todos os “caminhos” são válidos e que a comunidade cientifica deve explorar cada um deles. “O importante neste momento é salvar vidas”, assegura. Isto porquê? Vamos precisar de bastante tempo até termos uma vacina realmente eficaz, daí que o recurso a medicamentos já existentes seja um percurso interessante e que não deve ser descartado.

O cientista português do IMM vai agora desenvolver uma série de experiências laboratoriais, por um lado, para perceber como é que a “proteína da espícula” facilita a entrada do vírus no corpo humano; e por outro, vai procurar uma molécula que se ligue à “proteína da espícula” de modo a inibir a “ligação” às células humanas.

 A vacina que normalmente só chegaria dentro de 2 a 3 anos, pode ser que surja um pouco mais cedo. Miguel Castanho tem uma estimativa intuitiva de um ano, mas admite que se trata disso mesmo de uma estimativa que pode até nem se concretizar. Basta pensarmos que no caso do HIV ainda hoje estamos à procura de uma vacina e dispomos apenas de tratamentos.

Miguel Castanho trabalhou em 2002-2003 com um grupo de investigadores chineses que tinham algumas moléculas que impediam a entrada do SARS-COV 1 nas células humanas.

 

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