O Tribunal da Relação de Lisboa anulou e mandou refazer a sentença no caso que condenou a ex-bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco, e outros arguidos que contestavam a legalidade da sindicância ordenada pelo Governo.
Num acórdão de 30 de janeiro do coletivo de desembargadores formado por Ivo Rosa, Manuela Trocado e Paula Cristina Bizarro, os magistrados consideraram que a condenação de Ana Rita Cavaco e Alexandre Oliveira por crime de desobediência deve ser considerada nula por não terem sido considerados na sentença elementos fundamentais para a sua legalidade.
Os desembargadores defenderam que, ao não se pronunciar sobre factos alegados pelos arguidos e que são passíveis de excluir qualquer responsabilidade criminal, o tribunal de primeira instância não cumpriu com a obrigação legal de tomar posição sobre factos que poderiam levar à absolvição dos arguidos.
A Relação entendeu, nomeadamente, que deveria constar da lista de factos provados ou não provados na sentença se a decisão dos representantes da Ordem dos Enfermeiros de impedir a entrada e permanência na sede do organismo dos inspetores da Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS), não permitir as diligências necessárias à sindicância e recusar facultar e informações resultou de aconselhamento jurídico por parte do advogado da Ordem.
A provar-se isso faria com que os arguidos tivessem agido “de total boa-fé e com consciência da licitude dos seus de atos de oposição”, esvaziando os pressupostos necessários para a existência de crime de desobediência, e que consequentemente “teria como efeito a absolvição dos arguidos”.
“(…) impõe-se anular a sentença recorrida, que deverá ser substituída por outra que, se necessário com recurso a repetição de prova, colmate as lacunas apontadas, decidindo em conformidade”, lê-se no acórdão da Relação de Lisboa relativamente aos arguidos Ana Rita Cavaco e Alexandre Oliveira.
Quanto à condenação de outro elemento da Ordem dos Enfermeiros à altura dos factos, Jorge Baltazar, a Relação absolveu-o do crime de desobediência pelo qual tinha sido condenado, com o coletivo de desembargadores a argumentar “não existir violação do dever de prestar declarações”.
O arguido foi condenado por recusar prestar declarações imediatas aos inspetores da IGAS no momento da sindicância.
A Relação entendeu que a exigência dos inspetores para que fossem prestadas declarações imediatas é uma ordem ilegal que viola a obrigação de notificação prévia para essas declarações sejam prestadas, que deveria ter sido dirigida à Ordem dos Enfermeiros.
A ex-bastonária da Ordem dos Enfermeiros, Ana Rita Cavaco, foi condenada em 04 de julho de 2024 a pagar uma multa de 1.700 euros pelos crimes de injúria agravada e desobediência no caso da sindicância ordenada pelo Ministério da Saúde em 2019.
A juíza Ana Antunes Calçada, do Juízo Local Criminal de Lisboa, condenou ainda os arguidos Alexandre Oliveira e Jorge Baltazar a multas de 900 e 720 euros, respetivamente, também por desobediência, mas absolveu o atual bastonário Luís Barreira do mesmo crime, por entender que houve “dúvida insanável” sobre a sua atuação perante os inspetores da IGAS.
Em causa neste processo estão duas deslocações de inspetores da IGAS, nos dias 08 e 13 de maio de 2019, à Ordem dos Enfermeiros (OE), com a ex-bastonária a argumentar que aquela ação inspetiva tinha “uma motivação política”, supostamente assente nas divergências públicas entre o organismo e Marta Temido, que redundou na desobediência ao dever de colaboração em prestar declarações ou fornecer documentos.