O investigador Pedro Vicente declarou à Lusa que há, de forma muito credível, uma relação entre as mudanças climáticas e os episódios de conflito, que estão a emergir cada vez mais na região do Sahel.
"Há aqui um elemento importante que é preciso trazer para a discussão. As mudanças climáticas não são só sobre agricultura ou as dificuldades da mesma, não são só sobre as dificuldades que as pessoas têm nas cidades e com os eventos extremos, são também causadores de conflito, nomeadamente na região do Sahel", declarou um dos fundadores do centro de investigação NOVAFRICA, na Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa (NOVASBE, na sigla em inglês).
O investigador explicou à Lusa que nesta região existia, antes das mudanças climáticas, uma relação simbiótica entre os pastores e os agricultores - sendo os pastores tendencialmente mais muçulmanos e os agricultores mais cristãos.
Assim, "numa altura do ano a terra era dos pastores e noutra, na das chuvas, era dos agricultores", contextualizou. Essa relação começou a deteriorar-se com as alterações climáticas, reiterou.
"Falamos muito dos conflitos [no Sahel], mas se calhar devíamos falar mais das causas profundas, em termos das alterações climáticas nestes eventos", reforçou.
Assim, em países como a Nigéria, o Níger, o Mali, o Burkina Faso e mesmo o Sudão, compostos de forma muito heterogénea, as mudanças climáticas são também causas de conflito.
"Agora, o que é que se pode fazer aqui? Eu não tenho uma grande resposta, mas talvez passe pela representação de todas as fações, digamos assim, de todas as etnias, nos Governos centrais destes países" da região, disse.
"Considero é que, ao nível global, há muita coisa que se pode fazer. As alterações climáticas são um problema solúvel, não são um destino absolutamente sem volta", prosseguiu.
No entanto, Pedro Vicente frisou também que existem problemas de coordenação de ações globais e que a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, nomeadamente a deste ano, COP29, que começa segunda-feira em Baku, no Azerbaijão, é "um instrumento fundamental de coordenação entre países".
A cimeira que juntará em Baku, capital do Azerbaijão, representantes de 197 países e da União Europeia, é entendida por diversas organizações ambientalistas, entre as quais a portuguesa Zero, como “um momento crucial para que os governos se comprometam a reduzir as emissões para metade até 2030, aumentar o financiamento climático, e a acelerar a ação antes da COP30”, que está marcada para o Brasil, em 2025.
Na agenda estarão em destaque pontos como a Nova Meta Coletiva Quantificada (NCQG, na sigla em inglês), depois de em 2015, na COP 21 em Paris, os governos terem estabelecido uma verba de 100 mil milhões de dólares por ano. O ano passado, na COP28 no Dubai, foi adotada uma decisão para iniciar este ano, em Baku, negociações para alcançar verbas mais ambiciosas para a mitigação dos impactos das alterações climáticas.
Em cima da mesa estará também o balanço global dos progressos desde o Acordo de Paris sobre redução de emissões, alcançado na COP21, esperando-se que de Baku saiam decisões que garantam a aplicação dos resultados deste primeiro balanço e que todos os países apresentem os seus planos.
Em termos de adaptação, a COP29 será também a oportunidade de países e blocos político-económicos chegarem a acordo para operacionalizar os respetivos planos e o Objetivo Global de Adaptação (GGA) até 2025.
Na agenda está ainda a operacionalização plena do Fundo de Resposta a Perdas e Danos (FRLD), que visa apoiar os países menos desenvolvidos e para o qual Portugal se comprometeu com cinco milhões de euros.
A COP29 ficará marcada pela ausência dos presidentes dos Estados Unidos e do Brasil, bem como da presidente da Comissão Europeia Úrsula von der Leyen, entre líderes de vários países que tradicionalmente participam nas negociações.