O investigador Hilson Cunha e Filho afirmou hoje que não aumentar os impostos sobre o álcool e o tabaco mostra “a total alienação” de quem faz o Orçamento do Estado sobre os problemas “realmente importantes” em termos de saúde.
O especialista em Saúde Pública comentava à agência Lusa uma notícia do Expresso segundo a qual o Governo não pretende subir os impostos sobre estes produtos em 2025, esperando que o aumento da arrecadação seja por via do crescimento esperado no consumo privado.
Para o investigador do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da Universidade Nova, a proposta do Orçamento do Estado faz “uma interpretação errada” do imposto sobre o consumo, que é para regular e inibir o consumo e não “um modo de obter receita”.
Mas o que é escrito é que o Governo tem “uma expectativa de que o consumo aumente e assim aumenta a receita, estimulando a economia a aumentar o consumo desses produtos na sociedade”.
No seu entender, trata-se de “uma visão extremamente pobre do que é o Orçamento de Estado para as Finanças”, comentando que “tentar estimular a economia e o consumo, para as pessoas beberem mais, fumarem mais e ter mais receita roça o absurdo”.
Há décadas a estudar as adições e os seus impactos, o investigador alertou que os impostos cobrados sobre este produtos “nunca vão conseguir suprir os gastos com doença, acidentes, perdas sociais e laborais que esse consumo causa”.
O investigador questionou que os autores do OE queiram estimular e aumentar o consumo de álcool quando Portugal já é um dos países do mundo com maiores níveis de consumo ‘per capita’ por ano (12,1 litros) e tem níveis preocupantes de morte na condução automóvel devido ao consumo de álcool e de cancros associados ao consumo de álcool, como os do aparelho digestivo ou da mama.
Observou ainda que todas as doenças crónicas não transmissíveis que têm o álcool, o tabaco e a alimentação como principais fatores de risco, além do sofrimento causado, sobrecarregam o SNS e a sua sustentabilidade.
Para Hilson Cunha e Filho, o Governo devia estar preocupado com a sustentabilidade do SNS, “tentando recolher destas empresas globalizadas, que dominam o mercado do álcool ou do tabaco, uma espécie de indemnização pelos danos causados à população”, mas “não é bem isto que tem em mente”.
Lamentou que sempre que se aumente os impostos sobre estes produtos seja para aumentar a receita e equilibrar o orçamento de estado e “nunca porque existe uma estratégia, por trás, de saúde para reduzir o consumo na população e assim reduzir os problemas”.
“Existe uma imensa preocupação em questões de gestão de como é que vão gerir e sustentar o SNS, mas uma política de saúde verdadeiramente respeitada por todos os outros ministérios e pelo Governo não existe”, lamentou o também dirigente da Confederação Portuguesa de Prevenção do Tabagismo, que tem assento no Fórum Nacional Álcool e Saúde.
O investigador apelou para que, na discussão da proposta do OE 2025, os partidos se dediquem a corrigir o Imposto Especial de Consumo, com vista a criar incentivos para que as escolhas e o comportamento dos consumidores seja mais saudável, bem como introduzir outras medidas políticas que permitam melhorar a saúde dos portugueses ao invés de se preocuparem apenas posteriormente em tratar os danos e as doenças consequentes.
Exemplificou que em alguns locais uma bebida alcoólica é mais barata do que de uma garrafa de água, defendendo: “Se o preço mínimo de uma bebida alcoólica fosse superior, a escolha do consumidor tenderia para a continuidade do consumo, mas de água ao invés de álcool”.
“Portanto, não optaria por não consumir nada, pelo que o impacto na economia tenderia a ser muito reduzido ou mesmo nulo. O mesmo para bebidas com excesso de açúcar. Essa é a lógica do mercado e que deve ser vista pelas Finanças”, defendeu.