A Associação dos Profissionais de Saúde Unidos e Solidários de Moçambique (APSUSM) classificou hoje a situação no sistema nacional como caótica, alertando que os profissionais, em protestos constantes nos últimos meses, estão a operar sem condições.
“Faltam medicamentos para doenças como malária e hipertensão arterial. Eu posso mencionar um exemplo recente do que aconteceu na Beira [província de Sofala], em que utentes foram à televisão para denunciar a falta de reagentes para fazer hemodiálise, o que consideramos gravíssimo”, disse a secretária-geral da APSUSM, Sheila Chuquela, em entrevista à Lusa.
Aquele organismo, que abrange cerca de 65.000 profissionais de saúde de diferentes departamentos do Sistema Nacional de Saúde, exceto os médicos, reivindica, há mais de um ano, melhores condições de trabalho, exige o pagamento de horas extraordinárias, além de um melhor enquadramento no âmbito da implementação da nova Tabela Salarial Única.
A associação chegou a paralisar as atividades por diversas vezes e, há uma semana, anunciou a prorrogação da suspensão de uma greve que tinha sido convocada em finais de maio, resultado de negociações com o Governo, mas alerta que a situação continua caótica no Sistema Nacional de Saúde.
“A situação continua difícil para nós porque trabalhamos sob forma de improviso, são muitos remendos que temos de fazer que é para conseguir prestar o mínimo de atendimento adequado (…) Se um hospital grande como o [Central] da Beira não tem condições, existem tantas outras coisas que não são reportadas, então imagina o que acontece nas unidades sanitárias distritais ou centros de saúde (rurais)? A situação é triste e lamentável”, considerou Chuquela, profissional de saúde há quase 12 anos.
Entre outros aspetos, a associação exige que o Governo providencie medicamentos aos hospitais, que têm, em alguns casos, de ser adquiridos pelos pacientes, a aquisição de camas hospitalares, a resolução do problema da "falta de alimentação", bem como o equipamento de ambulâncias com materiais de emergência e equipamentos de proteção individual não descartável, cuja falta vai "obrigando os funcionários a comprarem do seu próprio bolso".
“Não temos gessos em muitas unidades sanitárias, [falta] medicação e temos visto casos que o paciente recebe uma receita hospitalar, mas quando vai à farmácia não há medicação. Então está um caos, não conseguimos ver melhorias”, afirmou Rossana Zunguze, profissional de saúde há 10 anos e membro da APSUSM.
A organização alerta para a possibilidade de uma nova paralisação face à alegada falta de vontade do Governo em resolver a situação, acusando o Ministério da Saúde em alguns pontos do país de estar a “perseguir os grevistas”, com cortes salariais e transferências arbitrárias nas províncias de Gaza, Maputo, Inhambane, no Sul, e Nampula, no Norte.
“Temos colegas que [devido aos cortes] só receberam 100 meticais (1,45 euros) e são esses que têm de ir trabalhar. Como vão se movimentar às suas unidades sanitárias para prestar serviços de saúde”, questionou Rossana Zunguze, considerando que a associação pondera, até, recorrer ao Tribunal Administrativo para resolver este problema.
Em 28 de maio, a associação anunciou a suspensão da greve que durava há quase um mês por 30 dias, após conversações com o Governo, avançando, na altura, que estavam a ser cumpridos “alguns pontos de revindicações”, entre os quais a resolução das irregularidades no pagamento de subsídios, a compra de equipamentos médicos e o reenquadramento definitivo dos profissionais na Tabela Salarial Única.
O Sistema Nacional de Saúde moçambicano enfrentou, nos últimos dois anos diversos momentos de pressão, provocados por greves de funcionários, convocadas, primeiro, pela Associação de Médicos Moçambicanos, contra cortes salariais e falta de pagamento de horas extraordinárias, e depois pela APSUSM, que exige melhores condições de trabalho também para outros profissionais.
O país tem um total de 1.778 unidades de saúde, 107 das quais são postos de saúde, três são hospitais especializados, quatro hospitais centrais, sete são gerais, sete provinciais, 22 rurais e 47 distritais, segundo dados do Ministério da Saúde a que a Lusa teve acesso.