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Familiares das vítimas e ONG exigem à ONU inquérito à explosão no porto de Beirute

LUSA
01-07-2024 14:07h

Familiares das vítimas e organizações não-governamentais (ONG) locais e internacionais exigiram hoje ao Conselho de Direitos Humanos da ONU a criação de uma comissão internacional para investigar a explosão de agosto de 2020 no porto de Beirute.

A explosão de 04 de agosto de 2020, que as autoridades libanesas têm atribuído a um incêndio num depósito no porto onde se encontravam armazenadas cerca de 2.750 toneladas de nitrato de amónio, deixou mais de 215 mortos e cerca de 6.500 feridos, além de mais de duas dezenas de desaparecidos e ainda mais de 300.000 desalojados, além de ter devastado três bairros inteiros,

"Quase quatro anos após a explosão, ninguém foi responsabilizado e as autoridades libanesas têm obstruído continuamente a investigação, levando à sua suspensão em dezembro de 2021”, denunciam numa carta enviada à ONU, endereçada também às redações, quase meia centena e cerca de duas dezenas de ONG.

Ramzi Kaiss, investigador da organização Human Rights Watch (HRW) no Líbano realçou o facto de, enquanto outros países condenaram a interferência contínua das autoridades libanesas na investigação interna, “as autoridades ignoraram descaradamente as exigências de responsabilização".

"Os Estados membros do Conselho de Direitos Humanos devem tomar medidas na sessão em curso para apoiar a criação de um mecanismo internacional de apuramento de factos, se alguma vez houver justiça para a desastrosa explosão de Beirute”, lê-se na declaração, de duas páginas.

“Nós, sobreviventes e familiares das vítimas da explosão do porto de Beirute em agosto de 2020, e organizações libanesas e internacionais, abaixo assinados, escrevemos para o exortar, durante a atual sessão do Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas, a apoiar uma resolução - ou, no mínimo, uma declaração conjunta - na 56.ª sessão ordinária do Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas, apelando ao estabelecimento de uma missão internacional, independente e imparcial de apuramento de factos sobre as violações dos direitos humanos relacionadas com a explosão do porto de Beirute de 04 de agosto de 2020”, afirmam os subscritores.

Na 52.ª sessão do Conselho dos Direitos Humanos, em março de 2023, 38 Estados emitiram uma declaração conjunta condenando a obstrução e a interferência generalizadas na investigação interna do Líbano sobre a explosão do porto de Beirute.

Na ocasião, exortaram o Líbano a "tomar todas as medidas necessárias para salvaguardar, na lei e na prática, a total independência e imparcialidade do poder judicial libanês" e a garantir a realização de um "inquérito rápido, independente, imparcial, credível e transparente sobre a explosão".

Mais de um ano depois, sustentam os subscritores, a investigação sobre a explosão continua paralisada e a ser "dificultada por obstrução sistémica, interferência, intimidação e um impasse político", como referido na declaração de março de 2023.

As vítimas da explosão e as suas famílias não têm tido qualquer recurso para obter a verdade e a justiça, uma vez que as autoridades libanesas têm repetidamente obstruído o curso da investigação interna.

Há anos que grupos libaneses e internacionais de defesa dos direitos humanos têm vindo a documentar a interferência política no sistema judicial, para além de investigações incorretas de homicídios politicamente sensíveis, e a criticar a falta de um sistema judicial independente, que tem permitido o florescimento de uma cultura de impunidade no Líbano.

Segundo os subscritores, as autoridades libanesas não tomaram quaisquer medidas significativas desde março de 2023 para permitir que a investigação interna fosse retomada sem interferências indevidas e para defender os direitos das vítimas a um recurso efetivo, à verdade e à justiça.

Além disso, as autoridades libanesas ainda não aprovaram um projeto de lei sobre a independência do poder judicial que esteja em conformidade com as normas internacionais, nem adotaram as alterações jurídicas necessárias para permitir a prossecução da investigação interna.

Em março de 2023, nove deputados do parlamento libanês apresentaram dois projectos de lei que reforçariam a independência das investigações judiciais e impediriam a interferência política no sistema judicial, mas o parlamento ainda não votou essas leis.

“À luz desta inação deliberada das autoridades libanesas, é urgentemente necessária uma missão internacional, independente e imparcial de apuramento dos factos sobre as violações dos direitos humanos relacionadas com a explosão do porto de Beirute”, escrevem.

Em agosto de 2022, seis peritos da ONU manifestaram apoio à investigação internacional e, um mês depois, o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Türk, denunciou a falta de responsabilização pela explosão do porto de Beirute e a interferência repetida de funcionários libaneses na investigação interna.

Türk defendeu então que essa deveria ser a altura de considerar uma missão internacional de apuramento de factos para analisar as violações dos direitos humanos relacionadas com a tragédia.

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